Recebi essa mensagem, do amigo Gil, muito valiosa para o pessoal que passou pelas casas dos 50 anos. Quem não passou ainda, passa para seus amigos que já estão por lá:
Velhice sem Demência
As demências podem ser evitadas com mudanças simples nos hábitos de vida', diz neurocirurgião Em entrevista ao GLOBO, o neurocirurgião Sanjay Gupta explica que o declínio cognitivo não é natural do envelhecimento e que o cérebro pode ser estimulado em qualquer idade
Por Giulia Vidale — São Paulo 10/05/2022 O Globo
Esquecimentos, dificuldade de raciocínio e para realizar tarefas do dia a dia são características normais do envelhecimento, certo?
De acordo com o médico americano Sanjay Gupta, chefe de neurocirurgia do Grady Memorial Hospital, em Atlanta, nos Estados Unidos, a resposta para essa pergunta é “não”. Para o médico, que passou três anos coletando evidências e conversando com especialistas do mundo todo sobre como entender o cérebro e melhor seu funcionamento, o declínio cognitivo e a demência não são consequências inevitáveis da velhice. As descobertas dessa jornada estão compiladas no livro “Mente Afiada: Desenvolva um cérebro ativo e saudável em qualquer idade”, recém-lançado no Brasil pela editora Sextante. Em entrevista ao GLOBO, por Zoom, Gupta garante que é possível estimular a criação de novos neurônios, melhorar a saúde e o funcionamento do seu cérebro em qualquer idade. Ele também explica qual é a melhor estratégia para manter a mente afiada (spoiler: não é palavra-cruzada nem sudoku) e oferece conselhos práticos – e simples - sobre como melhorar a função cognitiva em qualquer idade.
Em seu livro, o senhor cita cinco pilares da saúde cerebral – mexer-se, descobrir, relaxar, nutrir-se e conectar-se. Qual deles é mais importante para deixar a mente afiada?
Estudo o cérebro há 25 anos e aprendi muito. A prática regular de atividade física é a ação que tem o efeito na saúde cerebral comprovado pelo maior número de evidências científicas. Eu acho que as pessoas ficam surpresas com isso, porque o senso comum diz que fazer palavras cruzadas seria melhor. Mas exercitar-se é a forma mais confiável de liberar o BDNF, sigla para fator neurotrófico derivado do cérebro. Essa é uma substância que seu corpo produz ou não. Você não pode injetar nem tomar uma pílula disso. E a forma mais confiável de produzi-la é através do movimento. Mas há um fato curioso sobre isso. Qualquer tipo de exercício é bom parar criar esses fatores neurotróficos que ajudam a estimular o crescimento cerebral. No entanto, o exercício intenso também libera cortisol, conhecido como hormônio do stress, e isso diminui o impacto dos fatores de crescimento. Então, é preciso entender que movimento é bom, mas o tipo de exercício bom para o cérebro é diferente do que impacta no coração. Uma caminhada rápida é mais benéfica para o meu cérebro do que uma corrida. A boa dieta é vital também. O cérebro é extremamente sensível ao açúcar. Para se ter uma ideia do impacto, se alguém vai fazer uma prova ou tem uma reunião importante e come muito açúcar isso vai desacelerar a função cerebral por um período. As pessoas acham que ingerindo açúcar terão mais energia, mas, na verdade, é o oposto. E isso vale para qualquer idade ou as estratégias variam de acordo com a idade? Não há dúvida que quanto mais cedo você começar essas estratégias, maior será o impacto. Mas mesmo se elas forem iniciadas mais tarde, haverá efeito. Pode ser que você tenha que adotar mais estratégias ou aplicá-las com maior intensidade, à medida que você envelhece, já que seu cérebro não estará naturalmente produzindo tantas novas células. Mas, no fundo, são as mesmas estratégias, em doses diferentes.
Antes de pensar em tratar algo com medicamentos, precisamos entender o impacto negativo que nossas ações estão causando no cérebro e resolvermos isso Bastam então manter bons hábitos de vida para manter o cérebro saudável?
Sou um neurocirurgião e sei que, às vezes, as pessoas precisam de tratamentos. A maior lição para mim foi entender que a maioria das pessoas no mundo desenvolvido não vive da maneira que os seres humanos deveriam viver. Como espécie, deveríamos estar nos movendo muito. Na verdade, as pessoas não se sentavam até ficarem velhas. Agora, nós sentamos a maior parte de nossos dias. O jeito que comemos também está errado. Não comíamos açúcar, exceto quando as frutas caiam das árvores. Agora, comemos centenas de quilos de açúcar por ano, em média. Outro fator é o sono. Nas culturas indígenas, as pessoas dormem de oito a nove horas por noite, porque não ficam olhando para o celular. Então, meu ponto é que, antes de pensar em tratar algo com medicamentos, precisamos entender o impacto negativo que nossas ações estão causando no cérebro e resolvermos isso.
O senhor diz que socializar é mais importante do que fazer palavras-cruzadas para o cérebro. No entanto, nos últimos dois anos nós passamos a maior parte do tempo isolados do contato com outras pessoas. Isso terá algum tipo de consequência?
Sim e existem muitas evidências sobre isso. Mas precisamos lembrar que antes da pandemia já se falava sobre o impacto negativo do isolamento e da solidão. O interessante é que a solidão é como as pessoas se sentem. Algumas pessoas podem não estar interagindo com ninguém, mas não se sentem solitárias. Outras, podem estar perto de muitas pessoas e ainda se sentirem sozinhas. Então é muito importante entender que a solidão não significa estar só fisicamente. Eu acho que apesar dos prejuízos, a pandemia também trouxe grandes lições. Primeiro, sobre a importância de socializar ao ar livre. Entendemos que os vírus não se espalham muito bem ao ar livre, o que é um ótimo local para fazer uma caminhada rápida. Esse exercício já vai fazer bem para o seu cérebro. Se você puder fazer isso acompanhado de um amigo ou membro da família, melhor. A segunda coisa é que vimos que existem outras formas de socializar. Antes da pandemia, nós não tínhamos dados sobre conexões virtuais como esta. Os dados eram todos baseados em conexões pessoais. Agora estamos obtendo muitos dados sobre o valor de apenas poder olhar para alguém quando estamos conversando, ver sua linguagem corporal, suas bocas se movendo, mesmo que virtualmente. Meus pais estão com quase 70 anos e moram em um estado diferente. A gente conversava muito por telefone, mas durante a pandemia começamos a fazer interações por vídeo e acho que isso fez uma grande diferença.
Não lembrar, mesmo que por um breve período, para que servem as chaves, é algo para se preocupar. Como as pessoas podem diferenciar o esquecimento normal de um indício de problema neurológico?
A falta de atenção está por trás da maioria dos problemas de memória. Acho que podemos usar o exemplo das chaves para exemplificar isso. Se você não consegue encontrar as chaves perdidas, provavelmente não é algo para se preocupar. Na maioria dos casos, isso significa apenas que ela simplesmente não estava prestando atenção no que estava fazendo. Para se lembrar de algo, você precisa se concentrar nisso. Se você não estava atento quando deixou as chaves em determinado lugar, você não esqueceu onde colocou suas chaves. Você nunca se lembrou onde colocou suas chaves. Por outro lado, não lembrar, mesmo que por um breve período, para que servem as chaves, é algo para se preocupar. Outro sinal de alerta é quando os problemas de memória começam a afetar o seu dia-a-dia de uma forma que você esquece coisas básicas, como tomar remédios ou tomar banho.
Na sociedade atual, ser multitarefas é sinônimo de produtividade. Entretanto, o senhor diz que a prática é prejudicial. A falta de atenção estaria por trás disso?
O cérebro gasta energia para alternar tarefas. A maior lição que eu aprendi é que quando você vai de uma tarefa para outra, sucessivamente, você está consumindo muita energia e não está sendo tão eficiente ou produtivo quanto pensa. Eu sou tão culpado disso como todo mundo. Às vezes você tem que fazer isso porque simplesmente precisa pegar as crianças na escola e terminar um trabalho. Mas é preciso ficar claro que ser multitarefa não vai aumentar sua produtividade. Quanto mais você puder organizar seu dia em compartimentos, por exemplo, trabalhar em uma coisa, parar, e depois iniciar outra, melhor.
O senhor fala muito sobre reserva cognitiva e resiliência cerebral. O que é isso e qual é a sua importância para manter o cérebro afiado?
Todos os humanos usam todo o cérebro, mas provavelmente usamos 10% do nosso cérebro, 90% do tempo. Para criar reserva cognitiva, que é a capacidade do cérebro de improvisar e se orientar em torno dos obstáculos que encontra, precisamos usar mais outras partes do cérebro. A maioria das pessoas acha que está treinando o cérebro ao fazer palavras-cruzadas ou sudoku. E, embora ambas sejam muito boas, essas duas coisas só vão ensinar seu cérebro a fazer algo repetidamente. É como ensiná-lo a dirigir na mesma rua, várias vezes. Para construir reserva, precisamos exercitar diferentes partes do cérebro. Isso significa tentar novas atividades. De preferência, algo que envolva a função motora. E se você puder fazer isso de forma diferente do que está acostumado, melhor ainda. Para mim, por exemplo, isso é pintar com a mão esquerda. Eu sou um péssimo artista, mas comecei a pintar durante a pandemia. E sou destro, mas agora me tornei um pintor canhoto. Esse é apenas um exemplo. Vale escovar os dentes ou tentar comer com a mão não dominante. Seja lá o que for, apenas tente fazer coisas diferentes. Isso vai ativar partes do seu cérebro de uma forma que nunca tinham sido ativadas antes, aumentando a reserva cognitiva, que leva à resiliência. Um cérebro resiliente vai olhar para determinada situação e ser capaz de descobrir imediatamente como lidar com ela, como resolver o problema, seja ele qual for. Já um cérebro que não tem muita resiliência é aquele que é imediatamente esmagado pela situação. Ele não sabe o que fazer e fica paralisado