1. ENCONTRO COM OS JORNALISTAS DURANTE O
VÔO PAPAL
Segunda-feira, 22 de Julho
de 2013
Padre
Lombardi
Santo Padre Francisco, bem-vindo ao meio desta
comunidade voadora de jornalistas, operadores das comunicações. Sentimos grande
emoção pela possibilidade de acompanhá-lo em sua primeira viagem
intercontinental, internacional, depois da comovedora deslocação a Lampedusa!
Além do mais, é a primeira viagem ao seu Continente, ao “fim do mundo”. É uma
viagem na companhia dos jovens; por isso, suscita um grande interesse. Como
pode ver, ocupamos todos os lugares disponíveis para os jornalistas neste vôo.
Somos mais de 70 pessoas, obedecendo a composição do grupo a critérios de
grande variedade, ou seja, temos representantes das televisões – tanto
repórteres como operadores de câmara –, os representantes da imprensa escrita,
das agências de notícias, da rádio, operadores de internet... Praticamente
estão representados, e de forma qualificada, todos os mass-media. E estão
representadas também as culturas, as diferentes línguas. Temos, neste vôo, um
bom grupo de italianos, em seguida aparecem naturalmente os brasileiros que
vieram inclusive do Brasil para voar junto com o Santo Padre: há dez
brasileiros que vieram de propósito para isso. Depois temos dez dos Estados
Unidos da América, nove da França, seis da Espanha; depois há ingleses,
mexicanos, alemães; também o Japão, a
Argentina – naturalmente –, a Polônia, Portugal e a Rússia estão representados.
Trata-se, portanto, de uma comunidade muito diversificada. Muitos dos que aqui
estão acompanham, freqüentemente, as viagens do Papa fora da Itália, ou seja,
já não estão em sua primeira experiência, antes, alguns são muito navegados,
conhecem essas viagens muito melhor do que o Santo Padre. Diversamente, outros
estão aqui pela primeira vez, porque – como os brasileiros, por exemplo –
acompanham especificamente esta viagem. Assim, decidimos dar-lhe as boas-vindas
a este grupo pela voz também de um de nós, ou melhor, uma de nós, que foi
escolhida – acho que sem problemas particulares de concorrência – porque é,
certamente, a pessoa que fez mais viagens ao estrangeiro com o Santo Padre:
está em disputa com o Doutor Gasbarri inclusive pelo número das viagens
realizadas. Além disso é uma pessoa que vem do seu Continente e, por
conseguinte, pode falar-lhe em espanhol, na sua língua; e é – para além do mais
– uma pessoa mulher, sendo justo que lhe demos a palavra. Então dou
imediatamente a palavra a Valentina Alazraki, que é a correspondente de
Televisa, há muitos anos – mas permanece sempre juvenil, como o Santo Padre vê
–, sentindo-nos contentes por a termos conosco mais não fosse porque algumas
semanas atrás partiu um pé e por isso temíamos que não pudesse vir. Mas não,
ajustou-o a tempo, tirou o gesso há dois ou três dias e agora já está no avião.
Portanto será ela que interpreta os sentimentos desta comunidade voadora para
com o Santo Padre.
Valentina
Alazraki:
Papa Francisco, bom dia! O único mérito que possuo para
ter o privilégio de dar-lhe as boas-vindas é o elevado número de horas de vôo.
Participei no primeiro vôo de João Paulo II ao México, o meu país. Então era a
mascote; agora, 34 anos e meio depois, sou a decana! Por isso tenho o
privilégio de dar-lhe as boas-vindas. Sabemos, pelos seus amigos e
colaboradores na Argentina, que os jornalistas não são propriamente “santos da
sua devoção”. Talvez tenha pensado que o Padre Lombardi o trouxe à cova dos
leões... A verdade, porém, é que não somos assim tão ferozes, e temos um grande
prazer em poder ser seus companheiros de viagem. Gostaríamos que o Santo Padre
nos visse assim, como companheiros de viagem, nesta e em muitas outras ainda.
Obviamente somos jornalistas, e se hoje, amanhã ou nos dias seguintes quiser
responder a perguntas, não vamos dizer que não, porque somos jornalistas. Vimos
que confiou esta sua viagem a Maria, tendo ido a Santa Maria Maior e vai ir a Aparecida; pensei oferecer-lhe um
pequeno presente, uma pequeníssima Virgem peregrina para que O acompanhe nesta
peregrinação e muitas mais. Por coincidência, trata-se da Virgem de Guadalupe;
ofereço-a não pelo fato de ser a Rainha do México mas porque é a Padroeira da
América, pelo que nenhum Virgem Maria se ressentirá: nem a da Argentina, nem a
de Aparecida, nem qualquer outra. Eu lha ofereço com imenso carinho da parte de
todos nós e com a esperança de que proteja o Santo Padre nesta viagem e em
muitas outras ainda.
Padre
Lombardi:
E agora demos a palavra ao Santo Padre, naturalmente
para que nos diga pelo menos algumas palavras introdutórias a esta viagem.
Papa
Francisco:
Bom dia! Bom dia a vocês todos! Disseram – eu ouvi
–coisas um bocado estranhas: “Que vocês não são santos da minha devoção”, “que
aqui eu estou no meio dos leões...”, ainda bem que não são muito ferozes!
Obrigado! Verdadeiramente eu não dou entrevistas, mas é porque não sei, não
consigo. Sou assim! Sinto um pouco de dificuldade em fazê-lo, mas agradeço a
companhia. Esta primeira viagem tem em vista encontrar os jovens, mas não
isolados da sua vida; eu quereria encontrá-los precisamente no tecido social,
em sociedade. Porque, quando isolamos os jovens, praticamos uma injustiça:
despojamo-los da sua pertença. Os jovens têm uma pertença: pertença a uma
família, a uma pátria, a uma cultura, a uma fé… Eles têm uma pertença, e não
devemos isolá-los! Sobretudo não devemos isolá-los inteiramente da sociedade!
Eles são verdadeiramente o futuro de um povo! Isto é verdade; mas não o são
somente eles: eles são o futuro, porque têm a força, são jovens, continuarão
para diante. Mas também, no outro extremo da vida, os idosos são o futuro de um
povo. Um povo tem futuro se vai em frente com ambos os pontos: com os jovens,
com a força, porque o levam para diante; e com os idosos, porque são eles que
oferecem a sabedoria da vida. E muitas vezes penso que fazemos uma injustiça
aos idosos, pondo-os de lado como se eles não tivessem nada para nos dar; eles
têm a sabedoria, a sabedoria da vida, a sabedoria da história, a sabedoria da
pátria, a sabedoria da família. E nós precisamos disto! Por isso, digo que vou
encontrar os jovens, mas no seu tecido social, principalmente com os idosos. É
verdade que a crise mundial não gera coisas boas para os jovens. Li, na semana
passada, a percentagem dos jovens desempregados; pensem que corremos o risco de
ter uma geração que não encontrou trabalho, e é o trabalho que confere à pessoa
a dignidade de ganhar o seu pão. Os jovens, neste momento, sofrem a crise. Aos
poucos fomo-nos acostumando a esta cultura do descarte: com os idosos, sucede
demasiadas vezes; mas agora acontece também com inúmeros jovens sem trabalho.
Também a eles chega a cultura do descarte. Temos de acabar com esse hábito de
descartar. Ao contrário, cultura da inclusão, cultura do encontro, fazer um
esforço para integrar a todos na sociedade. Isto é de certo modo o sentido que
eu quero dar a esta visita aos jovens, aos jovens na sociedade.
Agradeço-vos imenso, caríssimos, “santos de não
devoção” e “leões não muito ferozes”. Muito obrigado, muito obrigado mesmo! E
eu gostava de lhes saudar a cada um. Obrigado!
Padre
Lombardi:
Muito obrigado, Santo Padre, por esta introdução tão
expressiva. E agora vem todos saudá-lo: passam por aqui, desse modo podem vir e
cada um pode conhecê-lo, Santidade, apresentar-se; cada um diga de que mídia é,
de que televisão ou jornal vem. Assim o Papa o saúda e conhece…
Papa
Francisco:
Temos dez horas...
[Um a um, os jornalistas encontram o Santo Padre]
Padre
Lombardi:
Acabaram realmente de vir todos? Sim? Ótimo!
Agradecemos verdadeiramente de coração ao Papa Francisco porque foi – julgo eu
– para todos nós um momento inesquecível e penso que constituiu uma bela
introdução a esta viagem. Acho que o Santo Padre conquistou pelo menos um pouco
do coração destes “leões”, de modo que, durante a viagem, possam ser seus
colaboradores, isto é, compreendam a sua mensagem e a difundam com grande
eficácia. Obrigado, Santidade!
Papa
Francisco:
Agradeço-lhes de verdade e peço-lhes para ajudar-me e
colaborar, nesta viagem, para o bem, para o bem; o bem da sociedade: o bem dos
jovens e o bem dos idosos; ambos juntos, não o esqueçam! E eu fico um pouco
como o profeta Daniel: um pouco triste, porque vi que os leões não eram muito
ferozes! Obrigado, muito obrigado! Um abraço a todos! Obrigado!
2. CERIMÔNIA DE BOAS-VINDAS NO PALÁCIO DA
GUANABARA
Segunda-feira, 22 de Julho
de 2013
Senhora Presidenta,
Ilustres Autoridades,
Irmãos e amigos!
Quis Deus na sua amorosa providência que a primeira
viagem internacional do meu Pontificado me consentisse voltar à amada América
Latina, precisamente ao Brasil, nação que se gloria de seus sólidos laços com a
Sé Apostólica e dos profundos sentimentos de fé e amizade que sempre a uniram
de modo singular ao Sucessor de Pedro. Dou graças a Deus pela sua benignidade.
Aprendi que para ter acesso ao Povo Brasileiro, é
preciso ingressar pelo portal do seu imenso coração; por isso permitam-me que
nesta hora eu possa bater delicadamente a esta porta. Peço licença para entrar
e transcorrer esta semana com vocês. Não tenho ouro nem prata, mas trago o que
de mais precioso me foi dado: Jesus Cristo! Venho em seu Nome, para alimentar a
chama de amor fraterno que arde em cada coração; e desejo que chegue a todos e
a cada um a minha saudação: “A paz de Cristo esteja com vocês!”
Saúdo com deferência a Senhora Presidenta e os ilustres
membros do seu Governo. Obrigado pelo seu generoso acolhimento e por suas
palavras que externaram a alegria dos brasileiros pela minha presença em sua
Pátria. Cumprimento também o Senhor Governador deste Estado, que amavelmente
nos recebe na Sede do Governo, e o Senhor Prefeito do Rio de Janeiro, bem como
os Membros do Corpo Diplomático acreditado junto ao Governo Brasileiro, as
demais Autoridades presentes e todos quantos se prodigalizaram para tornar
realidade esta minha visita.
Quero dirigir uma palavra de afeto aos meus irmãos no
Episcopado, sobre quem pousa a tarefa de guiar o Rebanho de Deus neste imenso
País, e às suas amadas Igrejas Particulares. Esta minha visita outra coisa não
quer senão continuar a missão pastoral própria do Bispo de Roma de confirmar os
seus irmãos na Fé em Cristo, de animá-los a testemunhar as razões da Esperança
que d’Ele vem e de incentivá-los a oferecer a todos as inesgotáveis riquezas do
seu Amor.
O motivo principal da minha presença no Brasil, como é
sabido, transcende as suas fronteiras. Vim para a Jornada Mundial da Juventude.
Vim para encontrar os jovens que vieram de todo o mundo, atraídos pelos braços
abertos do Cristo Redentor. Eles querem agasalhar-se no seu abraço para, junto
de seu Coração, ouvir de novo o seu potente e claro chamado: “Ide e fazei
discípulos entre todas as nações”.
Estes jovens provêm dos diversos continentes, falam
línguas diferentes, são portadores de variegadas culturas e, todavia, em Cristo
encontram as respostas para suas mais altas e comuns aspirações e podem saciar
a fome de verdade límpida e de amor autêntico que os irmanem para além de toda
diversidade.
Cristo abre espaço para eles, pois sabe que energia
alguma pode ser mais potente que aquela que se desprende do coração dos jovens
quando conquistados pela experiência da sua amizade. Cristo “bota fé” nos
jovens e confia-lhes o futuro de sua própria causa: “Ide, fazei discípulos”.
Ide para além das fronteiras do que é humanamente possível e criem um mundo de
irmãos. Também os jovens “botam fé” em Cristo. Eles não têm medo de arriscar a
única vida que possuem porque sabem que não serão desiludidos.
Ao iniciar esta minha visita ao Brasil, tenho
consciência de que, ao dirigir-me aos jovens, falarei às suas famílias, às suas
comunidades eclesiais e nacionais de origem, às sociedades nas quais estão
inseridos, aos homens e às mulheres dos quais, em grande medida, depende o
futuro destas novas gerações.
Os pais usam dizer por aqui: “os filhos são a menina
dos nossos olhos”. Que bela expressão da sabedoria brasileira que aplica aos
jovens a imagem da pupila dos olhos, janela pela qual entra a luz regalando-nos
o milagre da visão! O que vai ser de nós, se não tomarmos conta dos nossos
olhos? Como haveremos de seguir em frente? O meu auspício é que, nesta semana,
cada um de nós se deixe interpelar por esta desafiadora pergunta.
E atenção! A juventude é a janela pela qual o futuro
entra no mundo. É a janela e, por isso, nos impõe grandes desafios. A nossa
geração se demonstrará à altura da promessa contida em cada jovem quando souber
abrir-lhe espaço. Isso significa: tutelar as condições materiais e imateriais
para o seu pleno desenvolvimento; oferecer a ele fundamentos sólidos, sobre os
quais construir a vida; garantir-lhe segurança e educação para que se torne
aquilo que ele pode ser; transmitir-lhe valores duradouros pelos quais a vida
mereça ser vivida, assegurar-lhe um horizonte transcendente que responda à sede
de felicidade autêntica, suscitando nele a criatividade do bem; entregar-lhe a
herança de um mundo que corresponda à medida da vida humana; despertar nele as
melhores potencialidades para que seja sujeito do próprio amanhã e
corresponsável do destino de todos. Com essas atitudes precedemos hoje o futuro
que entra pela janela dos jovens.
Concluindo, peço a todos a delicadeza da atenção e, se
possível, a necessária empatia para estabelecer um diálogo de amigos. Nesta
hora, os braços do Papa se alargam para abraçar a inteira nação brasileira, na
sua complexa riqueza humana, cultural e religiosa. Desde a Amazônia até os
pampas, dos sertões até o Pantanal, dos vilarejos até as metrópoles, ninguém se
sinta excluído do afeto do Papa. Depois de amanhã, se Deus quiser, tenho em
mente recordar-lhes todos a Nossa Senhora Aparecida, invocando sua proteção
materna sobre seus lares e famílias. Desde já a todos abençôo. Obrigado pelo
acolhimento!
3. HOMILIA NA MISSA NO SANTUÁRIO NACIONAL
DE APARECIDA
Quarta-feira, 24 de Julho
de 2013
Eminentíssimo Senhor Cardeal,
Venerados irmãos no episcopado e no sacerdócio,
Queridos irmãos e irmãs!
Quanta alegria me dá vir à casa da Mãe de cada
brasileiro, o Santuário de Nossa Senhora Aparecida. No dia seguinte à minha
eleição como Bispo de Roma fui visitar a Basílica de Santa Maria Maior, para
confiar a Nossa Senhora o meu ministério. Hoje, eu quis vir aqui para suplicar
à Maria, nossa Mãe, o bom êxito da Jornada Mundial da Juventude e colocar aos
seus pés a vida do povo latino-americano.
Queria dizer-lhes, primeiramente, uma coisa. Neste
Santuário, seis anos atrás, quando aqui se realizou a V Conferência Geral do
Episcopado da América Latina e do Caribe, pude dar-me conta pessoalmente de um
fato belíssimo: ver como os Bispos – que trabalharam sobre o tema do encontro
com Cristo, discipulado e missão – eram animados, acompanhados e, em certo
sentido, inspirados pelos milhares de peregrinos que vinham diariamente confiar
a sua vida a Nossa Senhora: aquela Conferência foi um grande momento de vida de
Igreja. E, de fato, pode-se dizer que o Documento de Aparecida nasceu
justamente deste encontro entre os trabalhos dos Pastores e a fé simples dos
romeiros, sob a proteção maternal de Maria. A Igreja, quando busca Cristo, bate
sempre à casa da Mãe e pede: “Mostrai-nos Jesus”. É de Maria que se aprende o
verdadeiro discipulado. E, por isso, a Igreja sai em missão sempre na esteira
de Maria.
Assim, de cara à Jornada Mundial da Juventude que me
trouxe até o Brasil, também eu venho hoje bater à porta da casa de Maria, que
amou e educou Jesus, para que ajude a todos nós, os Pastores do Povo de Deus,
aos pais e aos educadores, a transmitir aos nossos jovens os valores que farão
deles construtores de um País e de um mundo mais justo, solidário e fraterno.
Para tal, gostaria de chamar à atenção para três simples posturas, três simples
posturas: Conservar a esperança; deixar-se surpreender por Deus; viver na
alegria.
1. Conservar a esperança. A segunda leitura da Missa
apresenta uma cena dramática: uma mulher – figura de Maria e da Igreja – sendo
perseguida por um Dragão – o diabo - que quer lhe devorar o filho. A cena,
porém, não é de morte, mas de vida, porque Deus intervém e coloca o filho a
salvo (cfr. Ap 12,13a.15-16a). Quantas dificuldades na vida de cada um, no
nosso povo, nas nossas comunidades, mas, por maiores que possam parecer, Deus
nunca deixa que sejamos submergidos. Frente ao desânimo que poderia aparecer na
vida, em quem trabalha na evangelização ou em quem se esforça por viver a fé
como pai e mãe de família, quero dizer com força: Tenham sempre no coração esta
certeza! Deus caminha a seu lado, nunca lhes deixa desamparados! Nunca percamos
a esperança! Nunca deixemos que ela se apague nos nossos corações! O “dragão”,
o mal, faz-se presente na nossa história, mas ele não é o mais forte. Deus é o
mais forte, e Deus é a nossa esperança! É verdade que hoje, mais ou menos todas
as pessoas, e também os nossos jovens, experimentam o fascínio de tantos ídolos
que se colocam no lugar de Deus e parecem dar esperança: o dinheiro, o poder, o
sucesso, o prazer. Frequentemente, uma sensação de solidão e de vazio entra no
coração de muitos e conduz à busca de compensações, destes ídolos passageiros.
Queridos irmãos e irmãs, sejamos luzeiros de esperança! Tenhamos uma visão
positiva sobre a realidade. Encorajemos a generosidade que caracteriza os
jovens, acompanhando-lhes no processo de se tornarem protagonistas da
construção de um mundo melhor: eles são um motor potente para a Igreja e para a
sociedade. Eles não precisam só de coisas, precisam sobretudo que lhes sejam
propostos aqueles valores imateriais que são o coração espiritual de um povo, a
memória de um povo. Neste Santuário, que faz parte da memória do Brasil, podemos
quase que apalpá-los: espiritualidade, generosidade, solidariedade,
perseverança, fraternidade, alegria; trata-se de valores que encontram a sua
raiz mais profunda na fé cristã.
2. A segunda postura: Deixar-se surpreender por Deus.
Quem é homem e mulher de esperança – a grande esperança que a fé nos dá – sabe
que, mesmo em meio às dificuldades, Deus atua e nos surpreende. A história
deste Santuário serve de exemplo: três pescadores, depois de um dia sem
conseguir apanhar peixes, nas águas do Rio Parnaíba, encontram algo inesperado:
uma imagem de Nossa Senhora da Conceição. Quem poderia imaginar que o lugar de
uma pesca infrutífera, tornar-se-ia o lugar onde todos os brasileiros podem se
sentir filhos de uma mesma Mãe? Deus sempre surpreende, como o vinho novo, no
Evangelho que ouvimos. Deus sempre nos reserva o melhor. Mas pede que nos
deixemos surpreender pelo seu amor, que acolhamos as suas surpresas. Confiemos
em Deus! Longe d’Ele, o vinho da alegria, o vinho da esperança, se esgota. Se
nos aproximamos d’Ele, se permanecemos com Ele, aquilo que parece água fria,
aquilo que é dificuldade, aquilo que é pecado, se transforma em vinho novo de
amizade com Ele.
3. A terceira postura: Viver na alegria. Queridos
amigos, se caminhamos na esperança, deixando-nos surpreender pelo vinho novo
que Jesus nos oferece, há alegria no nosso coração e não podemos deixar de ser
testemunhas dessa alegria. O cristão é alegre, nunca está triste. Deus nos
acompanha. Temos uma Mãe que sempre intercede pela vida dos seus filhos, por
nós, como a rainha Ester na primeira leitura (cf. Est 5, 3). Jesus nos mostrou
que a face de Deus é a de um Pai que nos ama. O pecado e a morte foram
derrotados. O cristão não pode ser pessimista! Não pode ter uma cara de quem
parece num constante estado de luto. Se estivermos verdadeiramente enamorados
de Cristo e sentirmos o quanto Ele nos ama, o nosso coração se “incendiará” de
tal alegria que contagiará quem estiver ao nosso lado. Como dizia Bento XVI,
aqui neste Santuário: “O discípulo sabe que sem Cristo não há luz, não há
esperança, não há amor, não há futuro” (Discurso inaugural da Conferência de
Aparecida [13 de maio de 2007]:Insegnamenti III/1 [2007], 861).
Queridos amigos, viemos bater à porta da casa de Maria.
Ela abriu-nos, fez-nos entrar e nos aponta o seu Filho. Agora Ela nos pede:
“Fazei o que Ele vos disser” (Jo 2,5). Sim, Mãe, nos comprometemos a fazer o
que Jesus nos disser! E o faremos com esperança, confiantes nas surpresas de
Deus e cheios de alegria. Assim seja.
4. VISITA AO HOSPITAL SÃO FRANCISCO DE
ASSIS
Quarta-feira, 24 de Julho
de 2013
Senhor Arcebispo do Rio de Janeiro,
Amados Irmãos no Episcopado
Distintas Autoridades,
Queridos membros da Venerável Ordem Terceira de São
Francisco da Penitência,
Prezados médicos, enfermeiros e demais profissionais de
saúde,
Amados jovens e familiares, boa noite!
Quis Deus que meus passos, depois do Santuário de Nossa
Senhora Aparecida, se dirigissem para um particular santuário do sofrimento
humano, que é o Hospital São Francisco de Assis. É bem conhecida a conversão do
Santo Patrono de vocês: o jovem Francisco abandona riquezas e comodidades para
fazer-se pobre no meio dos pobres, entende que não são as coisas, o ter, os
ídolos do mundo a verdadeira riqueza e que estes não dão a verdadeira alegria,
mas sim seguir a Cristo e servir aos demais; mas talvez seja menos conhecido o
momento em que tudo isto se tornou concreto na sua vida: foi quando abraçou um
leproso. Aquele irmão sofredor foi “mediador de luz (…) para São Francisco de
Assis” (Carta Enc. Lumen fidei, 57), porque, em cada irmão e irmã em
dificuldade, nós abraçamos a carne sofredora de Cristo. Hoje, neste lugar de
luta contra a dependência química, quero abraçar a cada um e cada uma de vocês
- vocês que são a carne de Cristo – e pedir a Deus que encha de sentido e de
esperança segura o caminho de vocês e também o meu.
Abraçar, abraçar. Precisamos todos aprender a abraçar
quem passa necessidade, como fez São Francisco. Há tantas situações no Brasil e
no mundo que reclamam atenção, cuidado, amor, como a luta contra a dependência
química. Frequentemente, porém, nas nossas sociedades, o que prevalece é o
egoísmo. São tantos os “mercadores de morte” que seguem a lógica do poder e do
dinheiro a todo o custo! A chaga do tráfico de drogas, que favorece a violência
e que semeia a dor e a morte, exige da inteira sociedade um ato de coragem. Não
é deixando livre o uso das drogas, como se discute em várias partes da América
Latina, que se conseguirá reduzir a difusão e a influência da dependência química.
É necessário enfrentar os problemas que estão na raiz do uso das drogas,
promovendo uma maior justiça, educando os jovens para os valores que constroem
a vida comum, acompanhando quem está em dificuldade e dando esperança no
futuro. Precisamos todos de olhar o outro com os olhos de amor de Cristo,
aprender a abraçar quem passa necessidade, para expressar solidariedade, afeto
e amor.
Mas abraçar não é suficiente. Estendamos a mão a quem
vive em dificuldade, a quem caiu na escuridão da dependência, talvez sem saber
como, e digamos-lhe: Você pode se levantar, pode subir; é exigente, mas é
possível se você o quiser. Queridos amigos, queria dizer a cada um de vocês,
mas sobretudo a tantas outras pessoas que ainda não tiveram a coragem de
empreender o mesmo caminho de vocês: Você é o protagonista da subida; esta é a
condição imprescindível! Você encontrará a mão estendida de quem quer lhe
ajudar, mas ninguém pode fazer a subida no seu lugar. Mas vocês nunca estão
sozinhos! A Igreja e muitas pessoas estão solidárias com vocês. Olhem para
frente com confiança; a travessia é longa e cansativa, mas olhem para frente,
existe “um futuro certo, que se coloca numa perspectiva diferente relativamente
às propostas ilusórias dos ídolos do mundo, mas que dá novo impulso e nova
força à vida de todos os dias” (Carta Encícl. Lumen fidei, 57). A vocês todos
quero repetir: Não deixem que lhes roubem a esperança! Não deixem que lhes
roubem a esperança! Mas digo também: Não roubemos a esperança, pelo contrário,
tornemo-nos todos portadores de esperança!
No Evangelho, lemos a parábola do Bom Samaritano, que
fala de um homem atacado por assaltantes e deixado quase morto ao lado da
estrada. As pessoas passam, olham, mas não param; indiferentes seguem o seu
caminho: não é problema delas! Quantas vezes nós dizemos: não é um meu
problema! Quantas vezes olhamos para o outro lado e fingimos que não vemos.
Somente um samaritano, um desconhecido, olha, para, levanta-o, estende-lhe a
mão e cuida dele (cf. Lc 10, 29-35). Queridos amigos, penso que aqui, neste
Hospital, se concretiza a parábola do Bom Samaritano. Aqui não há indiferença,
mas solicitude. Não há desinteresse, mas amor. A Associação São Francisco e a
Rede de Tratamento da Dependência Química ensinam a se debruçar sobre quem
passa por dificuldades porque veem nestas pessoas a face de Cristo, porque
nelas está a carne de Cristo que sofre. Obrigado a todo pessoal do serviço
médico e auxiliar aqui empenhado! O serviço de vocês é precioso! Realizem-no
sempre com amor; é um serviço feito a Cristo presente nos irmãos: “Todas as
vezes que fizestes isso a um destes mais pequenos, que são meus irmãos, foi a
mim que o fizestes” (Mt 25, 40), diz-nos Jesus.
E quero repetir a todos vocês que lutam contra a
dependência química, a vocês familiares que têm uma tarefa que nem sempre é
fácil: a Igreja não está longe dos esforços que vocês fazem, Ela lhes acompanha
com carinho. O Senhor está ao lado de vocês e lhes conduz pela mão. Olhem para
Ele nos momentos mais duros e Ele lhes dará consolação e esperança. E confiem
também no amor materno de Maria, sua Mãe. Esta manhã, no Santuário da
Aparecida, confiei cada um de vocês ao seu coração. Onde tivermos uma cruz para
carregar, ao nosso lado sempre está Ela, nossa Mãe. Deixo-lhes em suas mãos,
enquanto, afetuosamente, a todos abençoo. Obrigado!
5. VISITA À COMUNIDADE DA VARGINHA
Quinta-feira, 25 de julho
de 2013
Queridos irmãos e irmãs,
Que bom poder estar com vocês aqui! Desde o início,
quando planejava a minha visita ao Brasil, o meu desejo era poder visitar todos
os bairros deste País. Queria bater em cada porta, dizer “bom dia”, pedir um
copo de água fresca, beber um "cafezinho", falar como a amigos de
casa, ouvir o coração de cada um, dos pais, dos filhos, dos avós... Mas o
Brasil é tão grande! Não é possível bater em todas as portas! Então escolhi vir
aqui, visitar a Comunidade de vocês que hoje representa todos os bairros do
Brasil. Como é bom ser bem acolhido, com amor, generosidade, alegria! Basta ver
como vocês decoraram as ruas da Comunidade; isso é também um sinal do carinho
que nasce do coração de vocês, do coração dos brasileiros, que está em festa!
Muito obrigado a cada um de vocês pela linda acolhida! Agradeço a Dom Orani
Tempesta e ao casal Rangler e Joana pelas suas belas palavras.
1. Desde o primeiro instante em que toquei as terras
brasileiras e também aqui junto de vocês, me sinto acolhido. E é importante
saber acolher; é algo mais bonito que qualquer enfeite ou decoração. Isso é
assim porque quando somos generosos acolhendo uma pessoa e partilhamos algo com
ela – um pouco de comida, um lugar na nossa casa, o nosso tempo - não ficamos
mais pobres, mas enriquecemos. Sei bem que quando alguém que precisa comer bate
na sua porta, vocês sempre dão um jeito de compartilhar a comida: como diz o
ditado, sempre se pode “colocar mais água no feijão”! E vocês fazem isto com
amor, mostrando que a verdadeira riqueza não está nas coisas, mas no coração!
E povo brasileiro, sobretudo as pessoas mais simples,
pode dar para o mundo uma grande lição de solidariedade, que é uma palavra
frequentemente esquecida ou silenciada, porque é incômoda. Queria lançar um
apelo a todos os que possuem mais recursos, às autoridades públicas e a todas
as pessoas de boa vontade comprometidas com a justiça social: Não se cansem de
trabalhar por um mundo mais justo e mais solidário! Ninguém pode permanecer
insensível às desigualdades que ainda existem no mundo! Cada um, na medida das
próprias possibilidades e responsabilidades, saiba dar a sua contribuição para
acabar com tantas injustiças sociais! Não é a cultura do egoísmo, do
individualismo, que frequentemente regula a nossa sociedade, aquela que
constrói e conduz a um mundo mais habitável, mas sim a cultura da
solidariedade; ver no outro não um concorrente ou um número, mas um irmão.
Quero encorajar os esforços que a sociedade brasileira
tem feito para integrar todas as partes do seu corpo, incluindo as mais
sofridas e necessitadas, através do combate à fome e à miséria. Nenhum esforço
de “pacificação” será duradouro, não haverá harmonia e felicidade para uma
sociedade que ignora, que deixa à margem, que abandona na periferia parte de si
mesma. Uma sociedade assim simplesmente empobrece a si mesma; antes, perde algo
de essencial para si mesma. Lembremo-nos sempre: somente quando se é capaz de
compartilhar é que se enriquece de verdade; tudo aquilo que se compartilha se
multiplica! A medida da grandeza de uma sociedade é dada pelo modo como esta
trata os mais necessitados, quem não tem outra coisa senão a sua pobreza!
2. Queria dizer-lhes também que a Igreja, “advogada da
justiça e defensora dos pobres diante das intoleráveis desigualdades sociais e
econômicas, que clamam ao céu” (Documento de Aparecida, 395), deseja oferecer a
sua colaboração em todas as iniciativas que signifiquem um autêntico
desenvolvimento do homem todo e de todo o homem. Queridos amigos, certamente é
necessário dar o pão a quem tem fome; é um ato de justiça. Mas existe também
uma fome mais profunda, a fome de uma felicidade que só Deus pode saciar. Não
existe verdadeira promoção do bem comum, nem verdadeiro desenvolvimento do
homem, quando se ignoram os pilares fundamentais que sustentam uma nação, os
seus bens imateriais: a vida, que é dom de Deus, um valor que deve ser sempre
tutelado e promovido; a família, fundamento da convivência e remédio contra a
desagregação social; a educação integral, que não se reduz a uma simples
transmissão de informações com o fim de gerar lucro; a saúde, que deve buscar o
bem-estar integral da pessoa, incluindo a dimensão espiritual, que é essencial
para o equilíbrio humano e uma convivência saudável; a segurança, na convicção
de que a violência só pode ser vencida a partir da mudança do coração humano.
3. Queria dizer uma última coisa. Aqui, como em todo o
Brasil, há muitos jovens. Vocês, queridos jovens, possuem uma sensibilidade
especial frente às injustiças, mas muitas vezes se desiludem com notícias que
falam de corrupção, com pessoas que, em vez de buscar o bem comum, procuram o
seu próprio benefício. Também para vocês e para todas as pessoas repito: nunca
desanimem, não percam a confiança, não deixem que se apague a esperança. A
realidade pode mudar, o homem pode mudar. Procurem ser vocês os primeiros a
praticar o bem, a não se acostumarem ao mal, mas a vencê-lo. A Igreja está ao
lado de vocês, trazendo-lhes o bem precioso da fé, de Jesus Cristo, que veio
“para que todos tenham vida, e vida em abundância” (Jo 10,10).
Hoje a todos vocês, especialmente aos moradores dessa
Comunidade de Varginha, quero dizer: Vocês não estão sozinhos, a Igreja está
com vocês, o Papa está com vocês. Levo a cada um no meu coração e faço minhas
as intenções que vocês carregam no seu íntimo: os agradecimentos pelas
alegrias, os pedidos de ajuda nas dificuldades, o desejo de consolação nos
momentos de tristeza e sofrimento. Tudo isso confio à intercessão de Nossa
Senhora Aparecida, Mãe de todos os pobres do Brasil, e com grande carinho lhes
concedo a minha Bênção.
6. ENCONTRO COM OS JOVENS ARGENTINOS NA
CATEDRAL
Quinta-feira, 25 de julho
de 2013
Obrigado! Obrigado pela
presença! Obrigado por terem vindo! Obrigado àqueles que estão cá dentro! E
muito obrigado àqueles que ficaram lá fora, aos trinta mil – dizem-me – que
estão lá fora. Lhes saúdo daqui. Estão à chuva… Obrigado pelo gesto de virem ter
comigo, obrigado por terem vindo à Jornada da Juventude. Eu tinha sugerido ao
Doutor Gasbarri – que é a pessoa que gere, que organiza a viagem – que
encontrasse um lugarzinho para um encontro com vocês e, em metade de um dia,
arranjou tudo. Quero agradecer publicamente ao Doutor Gasbarri também por isso
que ele conseguiu fazer hoje.
Desejo dizer-lhes qual é a
conseqüência que eu espero da Jornada da Juventude: espero que façam barulho.
Aqui farão barulho, sem dúvida. Aqui, no Rio, farão barulho, farão certamente.
Mas eu quero que se façam ouvir também nas dioceses, quero que saiam, quero que
a Igreja saia pelas estradas, quero que nos defendamos de tudo o que é
mundanismo, imobilismo, nos defendamos do que é comodidade, do que é
clericalismo, de tudo aquilo que é viver fechados em nós mesmos. As paróquias,
as escolas, as instituições são feitas para sair; se não o fizerem, tornam-se
uma ONG e a Igreja não pode ser uma ONG. Que me perdoem os Bispos e os
sacerdotes, se alguns depois lhes criarem confusão. Mas este é o meu conselho.
Obrigado pelo que vocês puderem fazer.
Olhem! Eu penso que, neste
momento, a civilização mundial ultrapassou os limites, ultrapassou os limites
porque criou um tal culto do deus dinheiro, que estamos na presença de uma
filosofia e uma prática de exclusão dos dois pólos da vida que constituem as
promessas dos povos. A exclusão dos idosos, obviamente: alguém poderia ser
levado a pensar que nisso exista, oculta, uma espécie de eutanásia, isto é, não
se cuida dos idosos; mas há também uma eutanásia cultural, porque não se lhes
deixa falar, não se lhes deixa agir. E a exclusão dos jovens: a percentagem que
temos de jovens sem trabalho, sem emprego, é muito alta e temos uma geração que
não tem experiência da dignidade ganha com o trabalho. Assim, esta civilização
nos levou a excluir os dois vértices que são o nosso futuro. Por isso os jovens
devem irromper, devem fazer-se valer; os jovens devem sair para lutar pelos
valores, lutar por estes valores; e os idosos devem tomar a palavra, os idosos
devem tomar a palavra e ensinar-nos! Que eles nos transmitam a sabedoria dos
povos!
Pensando ao povo
argentino, de coração sincero peço aos idosos: não esmoreçam na missão de ser a
reserva cultura do nosso povo; reserva que transmite a justiça, que transmite a
história, que transmite os valores, que transmite a memória do povo. E vocês,
por favor, não se ponham contra os idosos: deixem-nos falar, ouçam-nos e sigam
em frente. Mas saibam, saibam que neste momento vocês, jovens, e os idosos
estão condenados ao mesmo destino: a exclusão. Não se deixem descartar. Claro,
para isso acho que vocês devem trabalhar. A fé em Jesus Cristo não é uma
brincadeira; é uma coisa muito séria. É um escândalo que Deus tenha vindo
fazer-se um de nós. É um escândalo que Ele tenha morrido numa cruz. É um
escândalo: o escândalo da Cruz. A Cruz continua a escandalizar; mas é o único
caminho seguro: o da Cruz, o de Jesus, o da Encarnação de Jesus. Por favor, não
“espremam” a fé em Jesus Cristo. Há a espremedura de laranja, há a espremedura
de maçã, há a espremedura de banana, mas, por favor, não bebam “espremedura” de
fé. A fé é integral, não se espreme. É a fé em Jesus. É a fé no Filho de Deus
feito homem, que me amou e morreu por mim. Resumindo: primeiro, façam-se ouvir,
cuidem dos extremos da população que são os idosos e os jovens. Não se deixem
excluir e não deixem que se excluam os idosos. Segundo, não “espremam” a fé em
Jesus Cristo. Com as Bem-aventuranças… que devemos fazer, Padre? Olhe! Você
leia as Bem-aventuranças, que lhe farão bem. Se, depois, você quer saber
concretamente o que deve fazer, leia o capítulo 25 de Mateus, que é o
regulamento segundo o qual vamos ser julgados. Com essas duas coisas, vocês têm
o Plano de Ação: as Bem-aventuranças e Mateus 25. Você não precisam ler mais.
Isso lhes peço de todo o coração. Está bem? Obrigado por essa unidade. Tenho
pena que vocês estejam aí enjaulados; eu lhes digo uma coisa: às vezes também
eu sinto isso; e não é uma boa coisa estar enjaulado. Isso lhes confesso de
coração, mas paciência! Eu entendo vocês. Também eu gostaria de estar mais
perto de vocês, mas entendo que, por razões de segurança, não se pode. Obrigado
por terem vindo! Obrigado por rezarem por mim! Isto lhes peço de coração.
Preciso. Eu preciso de suas orações, tenho tanta necessidade. Obrigado por
isso! Bem! Eu quero lhes dar a Bênção e, depois, benzeremos a imagem da Virgem
que vai percorrer toda a República… e a cruz de São Francisco; viajarão em
missão. Mas não esqueçam! Façam-se ouvir; cuidem dos dois extremos da vida: os
dois extremos da história dos povos que são os idosos e os jovens; e não
“espremam” a fé. E agora façamos uma oração para benzer a imagem da Virgem e,
em seguida, dar-lhes a Bênção.
Pomo-nos de pé para a
Bênção, mas antes quero agradecer as palavras que disse-me Dom Arancedo,
porque, como verdadeiro mal-educado, não lhe agradeci. Portanto, obrigado pelas
suas palavras!
ORAÇÃO
Em nome do Pai e do Filho
e do Espírito Santo.
Ave Maria...
Senhor, Tu deixaste no
meio de nós tua Mãe para que nos acompanhasse.
Que Ela cuide de nós e nos
proteja o nosso caminho, o nosso coração, a nossa fé.
Que nos faça discípulos
como Ela o foi, e missionários como Ela o foi também.
Que nos ensine a sair
pelas estradas.
Que nos ensine a sair de
nós mesmos.
Benzemos esta imagem,
Senhor, que vai percorrer o país.
Que Ela, com a sua
mansidão, a sua paz, nos indique o caminho.
Senhor, Tu és um
escândalo! Tu és um escândalo: o escândalo da Cruz. Uma Cruz que é humildade,
mansidão; uma Cruz que nos fala da proximidade de Deus. Benzemos também esta
imagem da Cruz que percorrerá o país.
Muito obrigado! Vemo-nos
nestes dias. Que Deus lhes abençoe. Rezem por mim. Não se esqueçam!
7. SAUDAÇÃO DO PAPA NA ACOLHIDA AOS
JOVENS
Praia
de Copacabana, Quinta-feira, 25 de Julho de 2013
Jovens
amigos,
«É bom estarmos aqui!»: exclamou Pedro, depois de ter
visto o Senhor Jesus transfigurado, revestido de glória. Queremos também nós
repetir estas palavras? Penso que sim, porque para todos nós, hoje, é bom estar
aqui juntos unidos em torno de Jesus! É Ele que nos acolhe e se faz presente em
meio a nós, aqui no Rio. Mas, no Evangelho, escutamos também as palavras de
Deus Pai: «Este é o meu Filho, o Eleito. Escutai-O!» (Lc 9, 35). Então, se por
um lado é Jesus quem nos acolhe, por outro também nós devemos acolhê-lo, ficar
à escuta da sua palavra, pois é justamente acolhendo a Jesus Cristo, Palavra
encarnada, que o Espírito Santo nos transforma, ilumina o caminho do futuro e
faz crescer em nós as asas da esperança para caminharmos com alegria (cf. Carta
enc. Lumen fidei, 7).
Mas o que podemos fazer? “Bote fé”. A cruz da Jornada
Mundial da Juventude peregrinou através do Brasil inteiro com este apelo. “Bote
fé”: o que significa? Quando se prepara um bom prato e vê que falta o sal, você
então “bota” o sal; falta o azeite, então “bota” o azeite… “Botar”, ou seja,
colocar, derramar.
É assim também na nossa vida, queridos jovens: se
queremos que ela tenha realmente sentido e plenitude, como vocês mesmos desejam
e merecem, digo a cada um e a cada uma de vocês: “bote fé” e a vida terá um
sabor novo, terá uma bússola que indica a direção; “bote esperança” e todos os
seus dias serão iluminados e o seu horizonte já não será escuro, mas luminoso;
“bote amor” e a sua existência será como uma casa construída sobre a rocha, o
seu caminho será alegre, porque encontrará muitos amigos que caminham com você.
“Bote fé”, “bote esperança”, “bote amor!
Mas quem pode nos dar tudo isso? No Evangelho,
escutamos a resposta: Cristo. “Este é o meu Filho, o Eleito. Escutai-O”! Jesus
é Aquele que nos traz a Deus e que nos leva a Deus; com Ele toda a nossa vida
se transforma, se renova e nós podemos olhar a realidade com novos olhos, «a
partir da perspectiva de Jesus e com os seus olhos» (Carta enc. Lumen fidei,
18). Por isso, hoje, lhes digo com força: “Bote Cristo” na sua vida, e você
encontrará um amigo em quem sempre confiar; “bote Cristo”, e você verá crescer
as asas da esperança para percorrer com alegria o caminho do futuro; “bote
Cristo” e a sua vida ficará cheia do seu amor, será uma vida fecunda.
Hoje, queria que
nos perguntássemos com sinceridade: em quem depositamos a nossa confiança? Em
nós mesmos, nas coisas, ou em Jesus? Sentimo-nos tentados a colocar a nós
mesmos no centro, a crer que somos somente nós que construímos a nossa vida, ou
que ela se encha de felicidade com o possuir, com o dinheiro, com o poder. Mas
não é assim! É verdade, o ter, o dinheiro, o poder podem gerar um momentode
embriaguez, a ilusão de ser feliz, mas, no fim de contas, são eles que nos
possuem e nos levam a querer ter sempre mais, a nunca estar saciados. “Bote
Cristo” na sua vida, deposite n’Ele a sua confiança e você nunca se
decepcionará! Vejam, queridos amigos, a fé realiza na nossa vida uma revolução
que podíamos chamar copernicana, porque nos tira do centro e o restitui a Deus;
a fé nos imerge no seu amor que nos dá segurança, força, esperança.
Aparentemente não muda nada, mas, no mais íntimo de nós mesmos, tudo muda. No
nosso coração, habita a paz, a mansidão, a ternura, a coragem, a serenidade e a
alegria, que são os frutos do Espírito Santo (cf. Gl 5, 22) e a nossa
existência se transforma, o nosso modo de pensar e agir se renova, torna-se o
modo de pensar e de agir de Jesus, de Deus. No Ano da Fé, esta Jornada Mundial
da Juventude é justamente um dom que nos é oferecido para ficarmos ainda mais
perto de Jesus, para ser seus discípulos e seus missionários, para deixar que
Ele renove a nossa vida.
Querido jovem: “bote Cristo” na sua vida. Nestes dias,
Ele lhe espera na Palavra; escute-O com atenção e o seu coração será inflamado
pela sua presença; “Bote Cristo”: Ele lhe acolhe no Sacramento do perdão, para
curar, com a sua misericórdia, as feridas do pecado. Não tenham medo de pedir
perdão a Deus. Ele nunca se cansa de nos perdoar, como um pai que nos ama. Deus
é pura misericórdia! “Bote Cristo: Ele lhe espera no encontro com a sua Carne
na Eucaristia, Sacramento da sua presença, do seu sacrifício de amor, e na
humanidade de tantos jovens que vão lhe enriquecer com a sua amizade, lhe
encorajar com o seu testemunho de fé, lhe ensinar a linguagem da caridade, da
bondade, do serviço. Você também, querido jovem, pode ser uma testemunha
jubilosa do seu amor, uma testemunha corajosa do seu Evangelho para levar a
este nosso mundo um pouco de luz.
“É bom estarmos aqui”, botando Cristo na nossa vida,
botando a fé, a esperança, o amor que Ele nos dá. Queridos amigos, nesta
celebração acolhemos a imagem de Nossa Senhora Aparecida. Com Maria, queremos
ser discípulos e missionários. Como Ela, queremos dizer «sim» a Deus. Peçamos
ao seu coração de mãe que interceda por nós, para que os nossos corações
estejam disponíveis para amar a Jesus e fazê-lo amar. Ele está esperando por
nós e conta conosco! Amém. (Fonte: http://papa.cancaonova.com/bote-fe-bote-esperanca-bote-amor-bote-cristo-em-sua-vida/)
8. HOMILIA NA ACOLHIDA AOS JOVENS NA
PRAIA DE COPACABANA
Quinta-feira, 25 de julho
de 2013
Queridos
jovens:
“É bom estarmos aqui!”: exclamou Pedro, depois de ter
visto o Senhor Jesus transfigurado, revestido de glória. Queremos também nós
repetir estas palavras? Penso que sim, porque para todos nós, hoje, é bom estar
aqui juntos unidos em torno de Jesus! É Ele que nos acolhe e se faz presente em
meio a nós, aqui no Rio. Mas, no Evangelho, escutamos também as palavras de
Deus Pai: “Este é o meu Filho, o Eleito. Escutai-O!” (Lc 9, 35). Então, se por
um lado é Jesus quem nos acolhe, por outro também nós devemos acolhê-lo, ficar
à escuta da sua palavra, pois é justamente acolhendo a Jesus Cristo, Palavra
encarnada, que o Espírito Santo nos transforma, ilumina o caminho do futuro e
faz crescer em nós as asas da esperança para caminharmos com alegria (cf. Carta
enc. Lumen fidei, 7).
Mas o que podemos fazer? “Bote fé”. A cruz da Jornada
Mundial da Juventude peregrinou através do Brasil inteiro com este apelo. “Bote
fé”: o que significa? Quando se prepara um bom prato e vê que falta o sal, você
então "bota" o sal; falta o azeite, então “bota” o azeite... “Botar”,
ou seja, colocar, derramar. É assim também na nossa vida, queridos jovens: se
queremos que ela tenha realmente sentido e plenitude, como vocês mesmos desejam
e merecem, digo a cada um e a cada uma de vocês: “bote fé” e a vida terá um
sabor novo, a vida terá uma bússola que indica a direção; “bote esperança” e
todos os seus dias serão iluminados e o seu horizonte já não será escuro, mas
luminoso; “bote amor” e a sua existência será como uma casa construída sobre a
rocha, o seu caminho será alegre, porque encontrará muitos amigos que caminham
com você. “Bote fé”, “bote esperança”, “bote amor”! Todos juntos: Bote fé, bote
esperança, bote amor!
Mas quem pode nos dar tudo isso? No Evangelho,
escutamos a resposta: Cristo. “Este é o meu Filho, o Eleito. Escutai-O”! Jesus
é Aquele que nos traz Deus e que nos leva a Deus; com Ele toda a nossa vida se
transforma, se renova e nós podemos olhar a realidade com novos olhos, “a
partir da perspectiva de Jesus e com os seus olhos” (Carta enc. Lumen fidei,
18). Por isso, hoje, lhes digo com força: “Bote Cristo” na sua vida, e você
encontrará um amigo em quem sempre confiar; “bote Cristo”, e você verá crescer
as asas da esperança para percorrer com alegria o caminho do futuro; “bote
Cristo” e a sua vida ficará cheia do seu amor, será uma vida fecunda.
Hoje, queria que nos perguntássemos com sinceridade: em
quem depositamos a nossa confiança? Em nós mesmos, nas coisas, ou em Jesus?
Sentimo-nos tentados a colocar a nós mesmos no centro, a crer que somos somente
nós que construímos a nossa vida, ou que ela se encha de felicidade com o
possuir, com o dinheiro, com o poder. Mas não é assim! É verdade, o ter, o
dinheiro, o poder podem gerar um momento de embriaguez, a ilusão de ser feliz,
mas, no fim de contas, são eles que nos possuem e nos levam a querer ter sempre
mais, a nunca estar saciados. “Bote Cristo” na sua vida, deposite n’Ele a sua
confiança e você nunca se decepcionará! Vejam, queridos amigos, a fé realiza na
nossa vida uma revolução que podíamos chamar copernicana, porque nos tira do
centro e o restitui a Deus; a fé nos imerge no seu amor que nos dá segurança,
força, esperança. Aparentemente não muda nada, mas, no mais íntimo de nós
mesmos, tudo muda. No nosso coração, habita a paz, a mansidão, a ternura, a
coragem, a serenidade e a alegria, que são os frutos do Espírito Santo (cf. Gl
5, 22) e a nossa existência se transforma, o nosso modo de pensar e agir se
renova, torna-se o modo de pensar e de agir de Jesus, de Deus. No Ano da Fé,
esta Jornada Mundial da Juventude é justamente um dom que nos é oferecido para
ficarmos ainda mais perto de Jesus, para ser seus discípulos e seus
missionários, para deixar que Ele renove a nossa vida.
Querido jovem: “bote Cristo” na sua vida. Nestes dias,
Ele o espera na Palavra; escute-O com atenção e o seu coração será inflamado
pela sua presença; “Bote Cristo”: Ele o acolhe no Sacramento do perdão, para
curar, com a sua misericórdia, as feridas do pecado. Não tenham medo de pedir
perdão a Deus. Ele nunca se cansa de nos perdoar, como um pai que nos ama. Deus
é pura misericórdia! “Bote Cristo”: Ele o espera no encontro com a sua Carne na
Eucaristia, Sacramento da sua presença, do seu sacrifício de amor, e na
humanidade de tantos jovens que vão lhe enriquecer com a sua amizade, lhe
encorajar com o seu testemunho de fé, lhe ensinar a linguagem da caridade, da
bondade, do serviço. Você também, querido jovem, pode ser uma testemunha
jubilosa do seu amor, uma testemunha corajosa do seu Evangelho para levar a
este nosso mundo um pouco de luz.
“É bom estarmos aqui”, botando Cristo na nossa vida,
botando a fé, a esperança, o amor que Ele nos dá. Queridos amigos, nesta
celebração acolhemos a imagem de Nossa Senhora Aparecida. Com Maria, queremos
ser discípulos e missionários. Como Ela, queremos dizer “sim” a Deus. Peçamos
ao seu coração de mãe que interceda por nós, para que os nossos corações
estejam disponíveis para amar a Jesus e fazê-lo amar. Ele está esperando por
nós e conta conosco! Amém.
9. HORA DA AVE MARIA/ANGELUS - Balcão do
Arcebispado, Rio de Janeiro
Sexta-feira, 26 de Julho
de 2013
Caríssimos irmãos e amigos, bom dia!
Dou graças à divina Providência por ter guiado meus
passos até aqui, na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Agradeço de
coração sincero a Dom Orani e também a vocês pelo acolhimento caloroso, com que
manifestam seu carinho pelo Sucessor de Pedro. Desejaria que a minha passagem
por esta cidade do Rio renovasse em todos o amor a Cristo e à Igreja, a alegria
de estar unidos a Ele e de pertencer a Igreja e o compromisso de viver e
testemunhar a fé.
Uma belíssima expressão da fé do povo é a “Hora da Ave
Maria”. É uma oração simples que se reza nos três momentos característicos da
jornada que marcam o ritmo da nossa atividade quotidiana: de manhã, ao meio-dia
e ao anoitecer. É, porém, uma oração importante; convido a todos a rezá-la com
a Ave Maria. Lembra-nos de um acontecimento luminoso que transformou a
história: a Encarnação, o Filho de Deus se fez homem em Jesus de Nazaré.
Hoje a Igreja celebra os pais da Virgem Maria, os avós
de Jesus: São Joaquim e Sant’Ana. Na casa deles, veio ao mundo Maria, trazendo
consigo aquele mistério extraordinário da Imaculada Conceição; na casa deles,
cresceu, acompanhada pelo seu amor e pela sua fé; na casa deles, aprendeu a
escutar o Senhor e seguir a sua vontade. São Joaquim e Sant’Ana fazem parte de
uma longa corrente que transmitiu a fé e o amor a Deus, no calor da família,
até Maria, que acolheu em seu seio o Filho de Deus e o ofereceu ao mundo,
ofereceu-o a nós. Vemos aqui o valor precioso da família como lugar
privilegiado para transmitir a fé!
Olhando para o ambiente familiar, queria destacar uma
coisa: hoje, na festa de São Joaquim e Sant’Ana, no Brasil como em outros
países, se celebra a festa dos avós. Como os avós são importantes na vida da
família, para comunicar o patrimônio de humanidade e de fé que é essencial para
qualquer sociedade! E como é importante o encontro e o diálogo entre as
gerações, principalmente dentro da família.
O Documento de Aparecida nos recorda: “Crianças e
anciãos constroem o futuro dos povos; as crianças porque levarão por adiante a
história, os anciãos porque transmitem a experiência e a sabedoria de suas
vidas” (Documento de Aparecida, 447).
Esta relação, este diálogo entre as gerações é um
tesouro que deve ser conservado e alimentado! Nesta Jornada Mundial da
Juventude, os jovens querem saudar os avós. Eles saúdam os seus avós com muito
carinho. Aos avós. Saudamos os avós. Eles, os jovens, saúdam os seus avós com
muito carinho e lhes agradecem pelo testemunho de sabedoria que nos oferecem
continuamente.
E agora, nesta praça, nas ruas adjacentes, nas casas
que acompanham conosco este momento de oração, sintamo-nos como uma única
grande família e nos dirijamos a Maria para que guarde as nossas famílias, faça
delas lares de fé e de amor, onde se sinta a presença do seu Filho Jesus [reza
do «Ângelus»].
10. VIA SACRA – PRAIA DE COPACABANA
Sexta-feira,
26 de julho de 2013
Queridos jovens,
Viemos hoje acompanhar Jesus no seu caminho de dor e de
amor, o caminho da Cruz, que é um dos momentos fortes da Jornada Mundial da
Juventude. No final do Ano Santo da Redenção, o Bem-aventurado João Paulo II
quis confiá-la a vocês, jovens, dizendo-lhes: «Levai-a pelo mundo, como sinal
do amor de Jesus pela humanidade e anunciai a todos que só em Cristo morto e
ressuscitado há salvação e redenção» (Palavras aos jovens [22 de abril de
1984]: Insegnamenti VII,1(1984), 1105). A partir de então a Cruz percorreu todos
os continentes e atravessou os mais variados mundos da existência humana,
ficando quase que impregnada com as situações de vida de tantos jovens que a
viram e carregaram. Ninguém pode tocar a Cruz de Jesus sem deixar algo de si
mesmo nela e sem trazer algo da Cruz de Jesus para sua própria vida. Nesta
tarde, acompanhando o Senhor, queria que ressoassem três perguntas nos seus
corações: O que vocês terão deixado na Cruz, queridos jovens brasileiros,
nestes dois anos em que ela atravessou seu imenso País? E o que terá deixado a
Cruz de Jesus em cada um de vocês? E, finalmente, o que esta Cruz ensina para a
nossa vida?
1. Uma antiga tradição da Igreja de Roma conta que o
Apóstolo Pedro, saindo da cidade para fugir da perseguição do Imperador Nero,
viu que Jesus caminhava na direção oposta e, admirado, lhe perguntou: «Para
onde vais, Senhor?». E a resposta de Jesus foi: «Vou a Roma para ser
crucificado outra vez». Naquele momento, Pedro entendeu que devia seguir o
Senhor com coragem até o fim, mas entendeu sobretudo que nunca estava sozinho
no caminho; com ele, sempre estava aquele Jesus que o amara até o ponto de
morrer na Cruz. Pois bem, Jesus com a sua cruz atravessa os nossos caminhos
para carregar os nossos medos, os nossos problemas, os nossos sofrimentos, mesmo
os mais profundos. Com a Cruz, Jesus se une ao silêncio das vítimas da
violência, que já não podem clamar, sobretudo os inocentes e indefesos; nela
Jesus se une às famílias que passam por dificuldades, que choram a perda de
seus filhos, ou que sofrem vendo-os presas de paraísos artificiais como a
droga; nela Jesus se une a todas as pessoas que passam fome, num mundo que
todos os dias joga fora toneladas de comida; nela Jesus se une a quem é
perseguido pela religião, pelas ideias, ou simplesmente pela cor da pele; nela
Jesus se une a tantos jovens que perderam a confiança nas instituições
políticas, por verem egoísmo e corrupção, ou que perderam a fé na Igreja, e até
mesmo em Deus, pela incoerência de cristãos e de ministros do Evangelho. Na
Cruz de Cristo, está o sofrimento, o pecado do homem, o nosso também, e Ele
acolhe tudo com seus braços abertos, carrega nas suas costas as nossas cruzes e
nos diz: Coragem! Você não está sozinho a levá-la! Eu a levo com você. Eu venci
a morte e vim para lhe dar esperança, dar-lhe vida (cf. Jo 3,16).
2. E assim podemos responder à segunda pergunta: o que
foi que a Cruz deixou naqueles que a viram, naqueles que a tocaram? O que deixa
em cada um de nós? Deixa um bem que ninguém mais pode nos dar: a certeza do
amor inabalável de Deus por nós. Um amor tão grande que entra no nosso pecado e
o perdoa, entra no nosso sofrimento e nos dá a força para poder levá-lo, entra
também na morte para derrotá-la e nos salvar. Na Cruz de Cristo, está todo o
amor de Deus, a sua imensa misericórdia. E este é um amor em que podemos
confiar, em que podemos crer. Queridos jovens, confiemos em Jesus,
abandonemo-nos totalmente a Ele (cf. Carta enc. Lumen fidei, 16)! Só em Cristo
morto e ressuscitado encontramos salvação e redenção. Com Ele, o mal, o
sofrimento e a morte não têm a última palavra, porque Ele nos dá a esperança e
a vida: transformou a Cruz, de instrumento de ódio, de derrota, de morte, em
sinal de amor, de vitória e de vida. O primeiro nome dado ao Brasil foi
justamente o de «Terra de Santa Cruz». A Cruz de Cristo foi plantada não só na
praia, há mais de cinco séculos, mas também na história, no coração e na vida
do povo brasileiro e não só: o Cristo sofredor, sentimo-lo próximo, como um de
nós que compartilha o nosso caminho até o final. Não há cruz, pequena ou
grande, da nossa vida que o Senhor não venha compartilhar conosco.
3. Mas a Cruz de Cristo também nos convida a deixar-nos
contagiar por este amor; ensina-nos, pois, a olhar sempre para o outro com
misericórdia e amor, sobretudo quem sofre, quem tem necessidade de ajuda, quem
espera uma palavra, um gesto; ensina-nos a sair de nós mesmos para ir ao
encontro destas pessoas e lhes estender a mão. Tantos rostos acompanharam Jesus
no seu caminho até a Cruz: Pilatos, o Cireneu, Maria, as mulheres… Também nós
diante dos demais podemos ser como Pilatos que não teve a coragem de ir contra
a corrente para salvar a vida de Jesus, lavando-se as mãos. Queridos amigos, a
Cruz de Cristo nos ensina a ser como o Cireneu, que ajuda Jesus levar aquele
madeiro pesado, como Maria e as outras mulheres, que não tiveram medo de
acompanhar Jesus até o final, com amor, com ternura. E você como é? Como
Pilatos, como o Cireneu, como Maria? Queridos jovens, levamos as nossas
alegrias, os nossos sofrimentos, os nossos fracassos para a Cruz de Cristo;
encontraremos um Coração aberto que nos compreende, perdoa, ama e pede para
levar este mesmo amor para a nossa vida, para amar cada irmão e irmã com este
mesmo amor. Assim seja! (Fonte:
http://papa.cancaonova.com/discurso-do-papa-francisco-durante-a-via-sacra-com-os-jovens/)
11. HOMILIA NA MISSA COM OS BISPOS –
CATEDRAL METROPOLITANA
Sábado,
27 de julho de 2013
Amados
Irmãos em Cristo,
Vendo esta catedral lotada com Bispos, sacerdotes,
seminaristas, religiosos e religiosas vindos do mundo inteiro, penso nas
palavras do Salmo da Missa de hoje: «Que as nações vos glorifiquem, ó Senhor»
(Sl66). Sim, estamos aqui reunidos para glorificar o Senhor; e o fazemos
reafirmando a nossa vontade de sermos seus instrumentos, para que não somente
algumas nações mas todas glorifiquem o Senhor. Com a mesma parresia – coragem,
ousadia – de Paulo e Barnabé, anunciemos o Evangelho aos nossos jovens para que
encontrem Cristo, luz para o caminho, e se tornem construtores de um mundo mais
fraterno. Neste sentido, queria refletir com vocês sobre três aspectos da nossa
vocação: chamados por Deus; chamados para anunciar o Evangelho; chamados a
promover a cultura do encontro.
1. Chamados por Deus. É importante reavivar em nós esta
realidade que, frequentemente, damos por descontada em meio a tantas atividades
do dia-a-dia: «Não fostes vós que me escolhestes, mas eu que vos escolhi»,
diz-nos Jesus (Jo 15,16). Significa retornar à fonte da nossa chamada. No
início de nosso caminho vocacional, há uma eleição divina. Fomos chamados por
Deus, e chamados para permanecer com Jesus (cf. Mc 3, 14), unidos a Ele de um
modo tão profundo que nos permite dizer com São Paulo: «Eu vivo, mas não eu, é
Cristo que vive em mim» (Gal 2, 20). Este viver em Cristo configura realmente
tudo aquilo que somos e fazemos. E esta “vida em Cristo” é justamente o que
garante a nossa eficácia apostólica, a fecundidade do nosso serviço: «Eu vos
designei para irdes e para que produzais fruto e o vosso fruto permaneça» (Jo
15,16). Não é a criatividade pastoral, não são as reuniões ou planejamentos que
garantem os frutos, mas ser fiel a Jesus, que nos diz com insistência:
«Permanecei em mim, e eu permanecerei em vós» (Jo 15, 4). E nós sabemos bem o
que isso significa: Contemplá-lo, adorá-lo e abraçá-lo, particularmente através
da nossa fidelidade à vida de oração, do nosso encontro diário com Ele presente
na Eucaristia e nas pessoas mais necessitadas. O “permanecer” com Cristo não é
se isolar, mas é um permanecer para ir ao encontro dos demais. Vem-me à cabeça
umas palavras da Bem-aventurada Madre Teresa de Calcutá: «Devemos estar muito
orgulhosas da nossa vocação, que nos dá a oportunidade de servir Cristo nos
pobres. É nas favelas, nos «cantegriles» nas Villas miseria, que nós devemos ir
procurar e servir a Cristo. Devemos ir até eles como o sacerdote se aproxima do
altar, cheio de alegria» (Mother Instructions, I, p.80). Jesus, Bom Pastor, é o
nosso verdadeiro tesouro; procuremos fixar sempre mais n’Ele o nosso coração
(cf. Lc 12, 34).
2. Chamados para anunciar o Evangelho. Queridos bispos
e sacerdotes, muitos de vocês, senão todos, vieram acompanhar seus jovens à
Jornada Mundial. Eles também ouviram as palavras do mandato de Jesus: «Ide e
fazei discípulos entre todas as nações» (cf. Mt 28,19). É nosso compromisso
ajudá-los a fazer arder, no seu coração, o desejo de serem discípulos
missionários de Jesus. Certamente muitos, diante desse convite, poderiam
sentir-se um pouco atemorizados, imaginando que ser missionário significa
deixar necessariamente o País, a família e os amigos. Recordo o meu sonho da
juventude: partir missionário para o longínquo Japão. Mas Deus me mostrou que o
meu território de missão estava muito mais perto: na minha pátria. Ajudemos os
jovens a perceberem que ser discípulo missionário é uma consequência de ser
batizado, é parte essencial do ser cristão, e que o primeiro lugar onde
evangelizar é a própria casa, o ambiente de estudo ou de trabalho, a família e
os amigos.
Não poupemos forças na formação da juventude! São Paulo
usa uma bela expressão, que se tornou realidade na sua vida, dirigindo-se aos
seus cristãos: «Meus filhos, por vós sinto de novo as dores do parto até Cristo
ser formado em vós» (Gal 4, 19). Também nós façamos que isso se torne realidade
no nosso ministério! Ajudemos os nossos jovens a descobrir a coragem e a
alegria da fé, a alegria de ser pessoalmente amados por Deus, que deu o seu
Filho Jesus para nossa salvação. Eduquemo-los para a missão, para sair, para
partir. Jesus fez assim com os seus discípulos: não os manteve colados a si,
como uma galinha com os seus pintinhos; Ele os enviou! Não podemos ficar
encerrados na paróquia, nas nossas comunidades, quando há tanta gente esperando
o Evangelho! Não se trata simplesmente de abrir a porta para acolher, mas de
sair pela porta fora para procurar e encontrar. Decididamente pensemos a
pastoral a partir da periferia, daqueles que estão mais afastados, daqueles que
habitualmente não freqüentam a paróquia. Também eles são convidados para a Mesa
do Senhor.
3. Chamados a promover a cultura do encontro. Em muitos
ambientes, infelizmente, ganhou espaço a cultura da exclusão, a “cultura do
descartável”. Não há lugar para o idoso, nem para o filho indesejado; não há
tempo para se deter com o pobre caído à margem da estrada. Às vezes parece que,
para alguns, as relações humanas sejam regidas por dois “dogmas” modernos:
eficiência e pragmatismo. Queridos Bispos, sacerdotes, religiosos e também
vocês, seminaristas, que se preparam para o ministério, tenham a coragem de ir
contra a corrente. Não renunciemos a este dom de Deus: a única família dos seus
filhos. O encontro e o acolhimento de todos, a solidariedade e a fraternidade
são os elementos que tornam a nossa civilização verdadeiramente humana.
Temos de ser servidores da comunhão e da cultura do
encontro. Permitam-me dizer: deveríamos ser quase obsessivos neste aspecto! Não
queremos ser presunçosos, impondo as “nossas verdades”. O que nos guia é a
certeza humilde e feliz de quem foi encontrado, alcançado e transformado pela
Verdade que é Cristo, e não pode deixar de anunciá-la (cf. Lc 24, 13-35).
Queridos irmãos e irmãs, fomos chamados por Deus,
chamados para anunciar o Evangelho e promover corajosamente a cultura do
encontro. A Virgem Maria seja o nosso modelo. Na sua vida, Ela deu «exemplo
daquele afeto maternal de que devem estar animados todos quantos cooperam na
missão apostólica que a Igreja, tem de regenerar os homens» (Conc. Ecum. Vat.
II, Cost. dogm. Lumen gentium, 65). Seja Ela a Estrela que guia com segurança
nossos passos ao encontro do Senhor. Amém. (Fonte:
http://papa.cancaonova.com/homilia-do-papa-francisco-na-missa-com-os-bispos-sacerdotes-religiosos-e-seminaristas/)
12. ENCONTRO COM A CLASSE DIRIGENTE DO
BRASIL NO TEATRO MUNICIPAL
Sábado,
27 de julho de 2013
Excelências,
Senhoras e Senhores, bom dia!
Agradeço a Deus pela possibilidade de me encontrar com
tão respeitável representação dos responsáveis políticos e diplomáticos,
culturais e religiosos, acadêmicos e empresariais deste Brasil imenso.
Queria lhes falar usando a bela língua portuguesa de
vocês mas, para poder me expressar melhor manifestando o que trago no coração,
prefiro falar em castelhano. Peço-lhes a cortesia de me perdoar!
Saúdo cordialmente a todos e lhes expresso o meu
reconhecimento. Agradeço a Dom Orani e ao senhor Walmyr Júnior as amáveis
palavras de boas vindas, de apresentação e testemunho. Nas senhoras e nos
senhores, vejo a memória e a esperança: a memória do caminho e da consciência
da sua Pátria e a esperança que esta Pátria, sempre aberta à luz que irradia do
Evangelho, possa continuar a desenvolver-se no pleno respeito dos princípios
éticos fundados na dignidade transcendente da pessoa.
Memória do passado e utopia na perspectiva do futuro se
encontram no presente, que não é uma conjuntura sem história e sem promessa,
mas um momento no tempo, um desafio a recolher sabedoria e sabê-la projetar.
Todos aqueles que possuem um papel de responsabilidade, em uma Nação, são
chamados a enfrentar o futuro "com os olhos calmos de quem sabe ver a
verdade", como dizia o pensador brasileiro Alceu Amoroso Lima [“Nosso
tempo”, in: A vida sobrenatural e o mundo moderno (Rio de Janeiro 1956), 106].
Queria compartilhar com os senhores e senhoras três aspectos deste olhar calmo,
sereno e sábio: primeiro, a originalidade de uma tradição cultural; segundo, a
responsabilidade solidária para construir o futuro; e terceiro, o diálogo
construtivo para encarar o presente.
1. Antes de mais nada, é justo valorizar a originalidade
dinâmica que caracteriza a cultura brasileira, com a sua extraordinária
capacidade para integrar elementos diversos. O sentir comum de um povo, as
bases do seu pensamento e da sua criatividade, os princípios fundamentais da
sua vida, os critérios de juízo sobre as prioridades, sobre as normas de ação,
assentam, fundem-se e crescem numa visão integral da pessoa humana.
Esta visão do homem e da vida, tal como a fez própria o
povo brasileiro, recebeu também a seiva do Evangelho, a fé em Jesus Cristo, no
amor de Deus e a fraternidade com o próximo. A riqueza desta seiva pode
fecundar um processo cultural fiel à identidade brasileira e, ao mesmo tempo,
um processo construtor de um futuro melhor para todos. Um processo que faz
crescer a humanização integral e a cultura do encontro e do relacionamento;
este é o modo cristão de promover o bem comum, a alegria de viver. E aqui
convergem a fé e a razão, a dimensão religiosa com os diversos aspectos da
cultura humana: arte, ciência, trabalho, literatura... O cristianismo une
transcendência e encarnação; tem a capacidade de revitalizar sempre o
pensamento e a vida, frente à ameaça da frustração e do desencanto que podem
invadir os corações e saltam para a rua.
2. O segundo elemento que queria tocar é a responsabilidade
social. Esta exige um certo tipo de paradigma cultural e, consequentemente, de
política. Somos responsáveis pela formação de novas gerações, por ajudá-las a
ser hábeis na economia e na política, e firmes nos valores éticos. O futuro
exige hoje o trabalho de reabilitar a política; reabilitar a política, que é
uma das formas mais altas da caridade. O futuro exige também uma visão
humanista da economia e uma política que realize cada vez mais e melhor a
participação das pessoas, evitando elitismos e erradicando a pobreza. Que
ninguém fique privado do necessário, e que a todos sejam asseguradas dignidade,
fraternidade e solidariedade: esta é a estrada proposta. Já no tempo do profeta
Amós era muito frequente a advertência de Deus: «Eles vendem o justo por
dinheiro, o indigente, por um par de sandálias; esmagam a cabeça dos fracos no
pó da terra e tornam a vida dos oprimidos impossível» (Am 2, 6-7). Os gritos
por justiça continuam ainda hoje.
Quem detém uma função de guia – permitam-me dizer –quem
a vida ungiu como guia deve ter objetivos concretos e buscar os meios
específicos para alcançá-los, mas também pode haver o perigo da desilusão, da
amargura, da indiferença, quando as aspirações não se realizam. Aqui faço apelo
à dinâmica da esperança, que nos impele a ir sempre mais longe, a empregar
todas as energias e capacidades a favor das pessoas para quem se trabalha,
aceitando os resultados e criando condições para descobrir novos caminhos,
dando-se mesmo sem ver resultados, mas mantendo viva a esperança, com aquela
constância e coragem que nascem da aceitação da própria vocação de guia e de
dirigente.
É próprio da liderança escolher a mais justa entre as
opções, após tê-las considerado, partindo da própria responsabilidade e do
interesse pelo bem comum; por esta estrada, chega-se ao centro dos males da
sociedade, para vencê-los com a ousadia de ações corajosas e livres. É nossa
responsabilidade, embora sempre limitada, esta compreensão global da realidade,
observando, medindo, avaliando, para tomar decisões na hora presente, mas
estendendo o olhar para o futuro, refletindo sobre as consequências de tais
decisões. Quem atua responsavelmente, submete a própria ação aos direitos dos
outros e ao juízo de Deus. Este sentido ético aparece, nos nossos dias, como um
desafio histórico sem precedentes; devemos procurá-lo, devemos inseri-lo na
própria sociedade. Além da racionalidade científica e técnica, na atual
situação, impõe-se o vínculo moral com uma responsabilidade social e
profundamente solidária.
3. Para completar esta reflexão, além do humanismo
integral, que respeite a cultura original, e da responsabilidade solidária,
considero fundamental para enfrentar o presente: o diálogo construtivo. Entre a
indiferença egoísta e o protesto violento, há uma opção sempre possível: o
diálogo. O diálogo entre as gerações, o diálogo no povo, porque todos somos
povo, a capacidade de dar e receber, permanecendo abertos à verdade. Um país
cresce, quando dialogam de modo construtivo as suas diversas riquezas
culturais: a cultura popular, a cultura universitária, a cultura juvenil, a
cultura artística e a cultura tecnológica, a cultura econômica e a cultura da
família, e a cultura da mídia. Quando dialogam… É impossível imaginar um futuro
para a sociedade, sem uma vigorosa contribuição das energias morais numa
democracia que permaneça fechada na pura lógica ou no mero equilíbrio de
representação de interesses constituídos. Considero também fundamental neste
diálogo a contribuição das grandes tradições religiosas, que desempenham um
papel fecundo de fermento da vida social e de animação da democracia. Favorável
à pacífica convivência entre religiões diversas é a laicidade do Estado que,
sem assumir como própria qualquer posição confessional, respeita e valoriza a
presença da dimensão religiosa na sociedade, favorecendo as suas expressões
mais concretas.
Quando os líderes dos diferentes setores me pedem um
conselho, a minha resposta é sempre é a mesma: diálogo, diálogo, diálogo. A
única maneira para uma pessoa, uma família, uma sociedade crescer, a única
maneira para fazer avançar a vida dos povos é a cultura do encontro; uma
cultura segundo a qual todos têm algo de bom para dar, e todos podem receber em
troca algo de bom. O outro tem sempre algo para nos dar, desde que saibamos nos
aproximar dele com uma atitude aberta e disponível, sem preconceitos. Esta
atitude aberta, disponível e sem preconceitos, eu a definiria como «humildade
social» que é o que favorece o diálogo.
Só assim pode crescer o bom entendimento entre as culturas e as religiões,
a estima de umas pelas outras livre de suposições gratuitas e num clima de
respeito pelos direitos de cada uma. Hoje, ou se aposta no diálogo, na cultura
do encontro, ou todos perdemos. Todos perdemos… Passa por aqui o caminho
fecundo.
Excelências,
Senhoras e Senhores!
Agradeço-lhes pela atenção. Acolham estas palavras como
expressão da minha solicitude de Pastor de Igreja e do respeito e afeto que
nutro pelo povo brasileiro. A fraternidade entre os homens e a colaboração para
construir uma sociedade mais justa não são um sonho fantasioso, mas o resultado
de um esforço harmônico de todos em favor do bem comum. Encorajo os senhores
neste seu empenho em favor do bem comum, que exige da parte de todos sabedoria,
prudência e generosidade. Confio-lhes ao Pai do Céu, pedindo-lhe, por
intercessão de Nossa Senhora Aparecida, que cumule de seus dons a cada um dos
presentes, suas respectivas famílias e comunidades humanas e de trabalho e, de
coração, peço a Deus que lhes abençoe. Muito obrigado!
13. ENCONTRO COM O EPISCOPADO BRASILEIRO
Sábado, 27 de Julho de
2013
Queridos Irmãos!
Como é bom e agradável encontrar-me aqui com vocês,
Bispos do Brasil!
Obrigado por terem vindo, e permitam que lhes fale como
amigos, pelo que prefiro usar o castelhano, para poder expressar melhor aquilo
que levo no coração. Peço-lhes que me perdoem!
Retiramo-nos um pouco, neste lugar preparado por nosso
irmão Dom Orani, para estar sozinhos e poder falar de coração a coração como
Pastores a quem Deus confiou o seu Rebanho. Nas ruas do Rio, jovens de todo o
mundo e muitas outras multidões estão esperando por nós, necessitados de serem
envolvidos pelo olhar misericordioso de Cristo Bom Pastor, que nós somos
chamados a tornar presente. Por isso, gozemos deste momento de descanso, de partilha,
de verdadeira fraternidade.
Começando pela Presidência da Conferência Episcopal e
do Arcebispo do Rio de Janeiro, quero abraçar a todos e cada um, especialmente
aos Bispos eméritos.
Mais do que um discurso formal, quero compartilhar
algumas reflexões com vocês.
A primeira veio à minha mente, quando da outra vez
visitei o Santuário de Aparecida. Lá, ao pé da imagem da Imaculada Conceição,
eu rezei por vocês, por suas Igrejas, por seus presbíteros, religiosos e
religiosas, por seus seminaristas, pelos leigos e as suas famílias, em
particular pelos jovens e os idosos, já que ambos constituem a esperança de um
povo: os jovens, porque eles carregam a força, o sonho, a esperança do futuro,
e os idosos, porque eles são a memória, a sabedoria de um povo.[1]
1.
Aparecida: chave de leitura para a missão da Igreja
Em Aparecida, Deus ofereceu ao Brasil a sua própria
Mãe. Mas, em Aparecida, Deus deu também uma lição sobre Si mesmo, sobre o seu
modo de ser e agir. Uma lição sobre a humildade que pertence a Deus como traço
essencial e que está no DNA de Deus. Há algo de perene para aprender sobre Deus
e sobre a Igreja, em Aparecida; um ensinamento, que nem a Igreja no Brasil nem
o próprio Brasil devem esquecer.
No início do evento que é Aparecida, está a busca dos
pescadores pobres. Tanta fome e poucos recursos. As pessoas sempre precisam de
pão. Os homens partem sempre das suas carências, mesmo hoje.
Possuem um barco frágil, inadequado; têm redes
decadentes, talvez mesmo danificadas, insuficientes.
Primeiro, há a labuta, talvez o cansaço, pela pesca,
mas o resultado é escasso: um falimento, um insucesso. Apesar dos esforços, as
redes estão vazias.
Depois, quando foi da vontade de Deus, comparece Ele
mesmo no seu Mistério. As águas são profundas e, todavia, encerram sempre a
possibilidade de Deus; e Ele chegou de surpresa, quem sabe quando já não o
esperávamos. A paciência dos que esperam por Ele é sempre posta à prova. E Deus
chegou de uma maneira nova, porque Deus é surpresa: uma imagem de barro frágil,
escurecida pelas águas do rio, envelhecida também pelo tempo. Deus entra sempre
nas vestes da pequenez.
Veem então a imagem da Imaculada Conceição. Primeiro o
corpo, depois a cabeça, em seguida a unificação de corpo e cabeça: a unidade.
Aquilo que estava quebrado retoma a unidade. O Brasil colonial estava dividido
pelo muro vergonhoso da escravatura. Nossa Senhora Aparecida se apresenta com a
face negra, primeiro dividida mas depois unida, nas mãos dos pescadores.
Há aqui um ensinamento que Deus quer nos oferecer. Sua
beleza refletida na Mãe, concebida sem pecado original, emerge da obscuridade
do rio. Em Aparecida, logo desde o início, Deus dá uma mensagem de recomposição
do que está fraturado, de compactação do que está dividido. Muros, abismos,
distâncias ainda hoje existentes estão destinados a desaparecer. A Igreja não
pode descurar esta lição: ser instrumento de reconciliação.
Os pescadores não desprezam o mistério encontrado no
rio, embora seja um mistério que aparece incompleto. Não jogam fora os pedaços
do mistério. Esperam a plenitude. E esta não demora a chegar. Há aqui algo de
sabedoria que devemos aprender. Há pedaços de um mistério, como partes de um
mosaico, que vamos encontrando. Nós queremos ver muito rápido a totalidade; e
Deus, pelo contrário, Se faz ver pouco a pouco. Também a Igreja deve aprender
esta expectativa.
Depois, os pescadores trazem para casa o mistério. O
povo simples tem sempre espaço para albergar o mistério. Talvez nós tenhamos
reduzido a nossa exposição do mistério a uma explicação racional; no povo, pelo
contrário, o mistério entra pelo coração. Na casa dos pobres, Deus encontra
sempre lugar.
Os pescadores agasalham: revestem o mistério da Virgem
pescada, como se Ela tivesse frio e precisasse ser aquecida. Deus pede para
ficar abrigado na parte mais quente de nós mesmos: o coração. Depois é Deus que
irradia o calor de que precisamos, mas primeiro entra com o subterfúgio de quem
mendiga. Os pescadores cobrem o mistério da Virgem com o manto pobre da sua fé.
Chamam os vizinhos para verem a beleza encontrada; eles se reúnem à volta dela;
contam as suas penas em sua presença e lhe confiam as suas causas. Permitem
assim que possam implementar-se as intenções de Deus: uma graça, depois a
outra; uma graça que abre para outra; uma graça que prepara outra. Gradualmente
Deus vai desdobrando a humildade misteriosa de sua força.
Há muito para aprender nessa atitude dos pescadores.
Uma Igreja que dá espaço ao mistério de Deus; uma Igreja que alberga de tal
modo em si mesma esse mistério, que ele possa encantar as pessoas, atraí-las.
Somente a beleza de Deus pode atrair. O caminho de Deus é o encanto que atrai.
Deus faz-se levar para casa. Ele desperta no homem o desejo de guardá-lo em sua
própria vida, na própria casa, em seu coração. Ele desperta em nós o desejo de
chamar os vizinhos, para dar-lhes a conhecer a sua beleza. A missão nasce
precisamente dessa fascinação divina, dessa maravilha do encontro. Falamos de
missão, de Igreja missionária. Penso nos pescadores que chamam seus vizinhos
para verem o mistério da Virgem. Sem a simplicidade do seu comportamento, a
nossa missão está fadada ao fracasso.
A Igreja tem sempre a necessidade urgente de não
desaprender a lição de Aparecida; não a pode esquecer. As redes da Igreja são
frágeis, talvez remendadas; a barca da Igreja não tem a força dos grandes
transatlânticos que cruzam os oceanos. E, contudo, Deus quer se manifestar
justamente através dos nossos meios, meios pobres, porque é sempre Ele que está
agindo.
Queridos irmãos, o resultado do trabalho pastoral não
assenta na riqueza dos recursos, mas na criatividade do amor. Fazem falta
certamente a tenacidade, a fadiga, o trabalho, o planejamento, a organização,
mas, antes de tudo, você deve saber que a força da Igreja não reside nela
própria, mas se esconde nas águas profundas de Deus, nas quais ela é chamada a
lançar as redes.
Outra lição que a Igreja deve sempre lembrar é que não
pode afastar-se da simplicidade; caso contrário, desaprende a linguagem do
Mistério. E não só ela fica fora da porta do Mistério, mas, obviamente, não
consegue entrar naqueles que pretendem da Igreja aquilo que não podem dar-se
por si mesmos: Deus. Às vezes, perdemos aqueles que não nos entendem, porque
desaprendemos a simplicidade, inclusive importando de fora uma racionalidade
alheia ao nosso povo. Sem a gramática da simplicidade, a Igreja se priva das
condições que tornam possível «pescar» Deus nas águas profundas do seu
Mistério.
Uma última lembrança: Aparecida surgiu em um lugar de
cruzamento. A estrada que ligava Rio, a capital, com São Paulo, a província
empreendedora que estava nascendo, e Minas Gerais, as minas muito cobiçadas
pelas cortes europeias: uma encruzilhada do Brasil colonial. Deus aparece nos
cruzamentos. A Igreja no Brasil não pode esquecer esta vocação inscrita em si
mesma desde a sua primeira respiração: ser capaz de sístole e diástole, de
recolher e divulgar.
2.
Apreço pelo percurso da Igreja no Brasil
Os Bispos de Roma tiveram sempre o Brasil e sua Igreja
em seu coração. Um maravilhoso percurso foi realizado. Passou-se das 12
dioceses durante o Concílio Vaticano I para as atuais 275 circunscrições. Não
teve início a expansão de um aparato governamental ou de uma empresa, mas sim o
dinamismo dos «cinco pães e dois peixes» – de que fala o Evangelho – que,
entrando em contato com a bondade do Pai, em mãos calejadas, tornaram-se
fecundos.
Hoje, queria agradecer o trabalho sem parcimônia de
vocês, Pastores, em suas Igrejas. Penso nos Bispos nas florestas, subindo e
descendo os rios, nas regiões semiáridas, no Pantanal, na pampa, nas selvas
urbanas das megalópoles. Amem sempre, com total dedicação, o seu rebanho! Mas
penso também em tantos nomes e tantas faces, que deixaram marcas indeléveis no
caminho da Igreja no Brasil, fazendo palpar com a mão a grande bondade de Deus por
esta Igreja[2].
Os Bispos de Roma nunca lhes deixaram sós; seguiram de
perto, encorajaram, acompanharam. Nas últimas décadas, o Beato João XXIII
convidou com insistência os Bispos brasileiros a prepararem o seu primeiro
plano pastoral e, daquele início, cresceu uma verdadeira tradição pastoral no
Brasil, que fez com que a Igreja não fosse um transatlântico à deriva, mas
tivesse sempre uma bússola. O Servo de Deus Paulo VI, para além de encorajar a
recepção do Concílio Vaticano II, com fidelidade mas também com traços
originais (veja-se a Assembleia Geral do CELAM, em Medellín), influiu
decisivamente sobre a autoconsciência da Igreja no Brasil através do Sínodo
sobre a evangelização e de um texto fundamental de referência que continua
atual: a Evangelii nuntiandi. O Beato João Paulo II visitou o Brasil três
vezes, percorrendo-o de cabo a rabo, de norte a sul, insistindo sobre a missão
pastoral da Igreja, a comunhão e participação, a preparação do Grande Jubileu,
a nova evangelização. Bento XVI escolheu Aparecida para realizar a V Assembleia
Geral do CELAM e isso deixou uma grande marca na Igreja de todo o Continente.
A Igreja no Brasil recebeu e aplicou com originalidade
o Concílio Vaticano II e o percurso realizado, embora tenha tido de superar
determinadas doenças infantis, levou a uma Igreja gradualmente mais madura,
aberta, generosa, missionária.
Hoje estamos em um novo momento. Segundo a feliz
expressão do Documento de Aparecida, não é uma época de mudança, mas uma
mudança de época. Sendo assim, hoje é cada vez mais urgente nos perguntarmos: O
que Deus pede a nós? A esta pergunta, queria tentar oferecer qualquer linha de
resposta.
3.
O ícone de Emaús como chave de leitura do presente e do futuro
Antes de mais nada, não devemos ceder ao medo, de que
falava o Beato John Henry Newman: «O mundo cristão está gradualmente se
tornando estéril, e esgota-se como uma terra profundamente explorada que se
torna areia».[3] Não devemos ceder ao desencanto, ao desânimo, às lamentações.
Nós trabalhamos duro e, às vezes, nos parece acabar derrotados: apodera-se de
nós o sentimento de quem tem de fazer o balanço de uma estação já perdida,
olhando para aqueles que nos deixam ou já não nos consideram credíveis,
relevantes.
Vamos ler a esta luz, mais uma vez, o episódio de Emaús
(cf. Lc 24, 13-15). Os dois discípulos escapam de Jerusalém. Eles se afastam da
«nudez» de Deus. Estão escandalizados com o falimento do Messias, em quem
haviam esperado e que agora aparece irremediavelmente derrotado, humilhado,
mesmo após o terceiro dia (cf. vv. 17-21). O mistério difícil das pessoas que
abandonam a Igreja; de pessoas que, após deixar-se iludir por outras propostas,
consideram que a Igreja – a sua Jerusalém – nada mais possa lhes oferecer de
significativo e importante. E assim seguem pelo caminho sozinhos, com a sua
desilusão. Talvez a Igreja lhes apareça demasiado frágil, talvez demasiado
longe das suas necessidades, talvez demasiado pobre para dar resposta às suas
inquietações, talvez demasiado fria para com elas, talvez demasiado
auto-referencial, talvez prisioneira da própria linguagem rígida, talvez lhes
pareça que o mundo fez da Igreja uma relíquia do passado, insuficiente para as
novas questões; talvez a Igreja tenha respostas para a infância do homem, mas
não para a sua idade adulta.[4] O fato é que hoje há muitos que são como os
dois discípulos de Emaús; e não apenas aqueles que buscam respostas nos novos e
difusos grupos religiosos, mas também aqueles que parecem já viver sem Deus
tanto em teoria como na prática.
Perante esta situação, o que fazer?
Faz falta uma Igreja que não tenha medo de entrar na
noite deles. Precisamos de uma Igreja capaz de encontrá-los no seu caminho.
Precisamos de uma Igreja capaz de inserir-se na sua conversa. Precisamos de uma
Igreja que saiba dialogar com aqueles discípulos, que, fugindo de Jerusalém,
vagam sem meta, sozinhos, com o seu próprio desencanto, com a desilusão de um
cristianismo considerado hoje um terreno estéril, infecundo, incapaz de gerar
sentido.
A globalização implacável e a intensa urbanização,
frequentemente selvagem, prometeram muito. Muitos se enamoraram das suas
potencialidades e, nelas, existe algo de verdadeiramente positivo, como, por
exemplo, a diminuição das distâncias, a aproximação das pessoas à cultura, a
difusão da informação e dos serviços. Mas, por outro lado, muitos vivem os seus
efeitos negativos sem dar-se conta de quanto esses prejudicam a própria visão
do homem e do mundo, gerando maior desorientação e um vazio que não conseguem
explicar. Alguns destes efeitos são a confusão acerca do sentido da vida, a
desintegração pessoal, a perda da experiência de pertencer a um «ninho», a
carência de um lugar e de laços profundos.
E, como não há quem lhes faça companhia e mostre com a
própria vida o caminho verdadeiro, muitos buscaram atalhos, porque se apresenta
demasiado alta a «medida» da Grande Igreja. Também existem aqueles que
reconhecem o ideal do homem e de vida proposto pela Igreja, mas não têm a
audácia de abraçá-lo. Pensam que este ideal seja grande demais para eles,
esteja fora das suas possibilidades; a meta a alcançar é inatingível. Todavia
não podem viver sem ter pelo menos alguma coisa – nem que seja uma caricatura –
daquilo que é parece demasiado alto e distante. Com a desilusão no coração,
partem à procura de qualquer coisa que lhes iludirá uma vez mais, ou
resignam-se a uma adesão parcial que, em última análise, não consegue dar
plenitude à sua vida.
A grande sensação de abandono e solidão, de não
pertencerem sequer a si mesmos que muitas vezes surge dessa situação, é
dolorosa demais para ser silenciada. Há necessidade de desabafar, restando-lhes
então a via da lamentação. Mas a própria lamentação torna-se, por sua vez, como
um bumerangue que regressa e acaba aumentando a infelicidade. Ainda poucas
pessoas são capazes de ouvir a dor: é preciso pelo menos anestesiá-lo.
Perante este panorama, precisamos de uma Igreja capaz
de fazer companhia, de ir para além da simples escuta; uma Igreja, que
acompanha o caminho pondo-se em viagem com as pessoas; uma Igreja capaz de
decifrar a noite contida na fuga de tantos irmãos e irmãs de Jerusalém; uma
Igreja que se dê conta de como as razões, pelas quais há pessoas que se
afastam, contém já em si mesmas também as razões para um possível retorno, mas
é necessário saber ler a totalidade com coragem. Jesus deu calor ao coração dos
discípulos de Emaús.
Eu gostaria que hoje nos perguntássemos todos: Somos
ainda uma Igreja capaz de aquecer o coração? Uma Igreja capaz de reconduzir a Jerusalém?
Capaz de acompanhar de novo a casa? Em Jerusalém, residem as nossas fontes:
Escritura, Catequese, Sacramentos, Comunidade, amizade do Senhor, Maria e os
Apóstolos... Somos ainda capazes de contar de tal modo essas fontes, que
despertem o encanto pela sua beleza?
Muitos se foram, porque lhes foi prometido algo de mais
alto, algo de mais forte, algo de mais rápido.
Mas haverá algo de mais alto que o amor revelado em
Jerusalém? Nada é mais alto do que o abaixamento da Cruz, porque lá se atinge
verdadeiramente a altura do amor! Somos ainda capazes de mostrar esta verdade
para aqueles que pensam que a verdadeira altura da vida esteja em outro lugar?
Porventura se conhece algo de mais forte que a força
escondida na fragilidade do amor, do bem, da verdade, da beleza?
A busca do que é cada vez mais rápido atrai o homem de
hoje: internet rápida, carros velozes, aviões rápidos, relatórios rápidos... E,
todavia, se sente uma necessidade desesperada de calma, quero dizer , de
lentidão. A Igreja sabe ainda ser lenta: no tempo para ouvir, na paciência para
costurar novamente e reconstruir? Ou a própria Igreja já se deixa arrastar pelo
frenesi da eficiência? Recuperemos, queridos Irmãos, a calma de saber
sintonizar o passo com as possibilidades dos peregrinos, com os seus ritmos de
caminhada, recuperemos a capacidade de estar lhes sempre perto para permitir a
eles abrirem uma brecha no desencanto que existe nos corações, para que possam
entrar. Eles querem esquecer Jerusalém onde residem as suas fontes, mas assim acabarão
por sentir sede. Faz falta uma Igreja ainda capaz de acompanhar o regresso a
Jerusalém! Uma Igreja, que seja capaz de fazer descobrir as coisas gloriosas e
estupendas que se dizem de Jerusalém, de fazer entender que ela é minha Mãe,
nossa Mãe, e não somos órfãos! Nela nascemos. Onde está a nossa Jerusalém em
que nascemos? No Batismo, no primeiro encontro de amor, na chamada, na
vocação![5] Precisamos de uma Igreja que volte a dar calor, a inflamar o
coração.
Precisamos de uma Igreja capaz ainda de devolver a
cidadania a muitos de seus filhos que caminham como em um êxodo.
4.
Os desafios da Igreja no Brasil
À luz do que eu disse, quero sublinhar alguns desafios
da amada Igreja que está no Brasil.
A
prioridade da formação: Bispos, sacerdotes, religiosos, leigos
Queridos irmãos, senão formarmos ministros capazes de
aquecer o coração das pessoas, de caminhar na noite com elas, de dialogarem com
as suas ilusões e desilusões, de recompor as suas desintegrações, o que
poderemos esperar para o caminho presente e futuro? Não é verdade que Deus se
tenha obscurecido nelas. Aprendamos a olhar mais profundamente: falta quem lhes
aqueça o coração, como sucedeu com os discípulos de Emaús (cf. Lc 24,32).
Por isso, é importante promover e cuidar uma formação
qualificada que crie pessoas capazes de descer na noite sem ser invadidas pela
escuridão e perder-se; capazes de ouvir a ilusão de muitos, sem se deixar
seduzir; capazes de acolher as desilusões, sem desesperar-se nem precipitar na
amargura; capazes de tocar a desintegração alheia, sem se deixar dissolver e
decompor na sua própria identidade.
Precisamos de uma solidez humana, cultural, afetiva,
espiritual, doutrinal.[6] Queridos Irmãos no Episcopado, é preciso ter a
coragem de levar a fundo uma revisão das estruturas de formação e preparação do
clero e do laicato da Igreja que está no Brasil. Não é suficiente uma vaga
prioridade da formação, nem documentos ou encontros. Faz falta a sabedoria
prática de levantar estruturas duradouras de preparação em âmbito local, regional,
nacional e que sejam o verdadeiro coração para o Episcopado, sem poupar forças,
solicitude e assistência. A situação atual exige uma formação qualificada em
todos os níveis. Vocês, Bispos, não podem delegar este dever, mas devem
assumi-lo como algo de fundamental para o caminho das suas Igrejas.
Colegialidade
e solidariedade da Conferência Episcopal
Para a Igreja no Brasil, não basta um líder nacional;
precisa de uma rede de «testemunhos» regionais, que, falando a mesma linguagem,
assegurem em todos os lugares, não a unanimidade, mas a verdadeira unidade na
riqueza da diversidade.
A comunhão é uma teia que deve ser tecida com paciência
e perseverança, que vai gradualmente «aproximando os pontos» para permitir uma
cobertura cada vez mais ampla e densa. Um cobertor só com poucos fios de lã não
aquece.
É importante lembrar Aparecida, o método de congregar a
diversidade; não tanto a diversidade de ideias para produzir um documento, mas
a variedade de experiências de Deus para pôr em movimento uma dinâmica vital.
Os discípulos de Emaús voltaram para Jerusalém,
contando a experiência que tinham feito no encontro com o Cristo Ressuscitado
(cf. Lc 24, 33-35). E lá tomaram conhecimento das outras manifestações do
Senhor e das experiências dos seus irmãos. A Conferência Episcopal é justamente
um espaço vital para permitir tal permuta de testemunhos sobre os encontros com
o Ressuscitado, no norte, no sul, no oeste... Faz falta, pois, uma progressiva
valorização do elemento local e regional. Não é suficiente a burocracia
central, mas é preciso fazer crescer a colegialidade e a solidariedade; será
uma verdadeira riqueza para todos.[7]
Estado
permanente de missão e conversão pastoral
Aparecida falou de estado permanente de missão[8] e da
necessidade de uma conversão pastoral.[9] São dois resultados importantes
daquela Assembleia para a Igreja inteira da região, e o caminho realizado no
Brasil a propósito destes dois pontos é significativo.
Quanto à missão, há que lembrar que a urgência deriva
de sua motivação interna, isto é, trata-se de transmitir uma herança, e, quanto
ao método, é decisivo lembrar que uma herança sucede como na passagem do
testemunho, do bastão, na corrida de estafeta: não se joga ao ar e quem
consegue apanhá-lo tem sorte, e quem não consegue fica sem nada. Para
transmitir a herança é preciso entregá-la pessoalmente, tocar a pessoa para
quem você quer doar, transmitir essa herança.
Quanto à conversão pastoral, quero lembrar que
«pastoral» nada mais é que o exercício da maternidade da Igreja. Ela gera, amamenta,
faz crescer, corrige, alimenta, conduz pela mão... Por isso, faz falta uma
Igreja capaz de redescobrir as entranhas maternas da misericórdia. Sem a
misericórdia, poucas possibilidades temos hoje de inserir-nos em um mundo de
«feridos», que têm necessidade de compreensão, de perdão, de amor.
Na missão, mesmo continental,[10] é muito importante
reforçar a família, que permanece célula essencial para a sociedade e para a
Igreja; os jovens, que são o rosto futuro da Igreja; as mulheres, que têm um
papel fundamental na transmissão da fé e constituem uma força quotidiana que
faz evoluir uma sociedade e a renova. Não reduzamos o empenho das mulheres na
Igreja,; antes, pelo contrário, promovamos o seu papel ativo na comunidade
eclesial. Se a Igreja perde as mulheres, na sua dimensão global e real, ela
corre o risco da esterilidade. Aparecida põe em evidência também a vocação e a
missão do homem na família, na Igreja e na sociedade, como pais, trabalhadores
e cidadãos.[11] Tende isso em séria consideração!
A função
da Igreja na sociedade
No âmbito da sociedade, há somente uma coisa que a
Igreja pede com particular clareza: a liberdade de anunciar o Evangelho de modo
integral, mesmo quando ele está em contraste com o mundo, mesmo quando vai
contra a corrente, defendendo o tesouro de que é somente guardiã, e os valores
dos quais não pode livremente dispor, mas que recebeu e deve ser-lhes fiel.
A Igreja afirma o direito de servir o homem na sua
totalidade, dizendo-lhe o que Deus revelou sobre o homem e sua realização, e
ela deseja tornar presente aquele patrimônio imaterial, sem o qual a sociedade
se desintegra, as cidades seriam arrasadas por seus próprios muros, abismos e
barreiras. A Igreja tem o direito e o dever de manter acesa a chama da
liberdade e da unidade do homem.
Educação, saúde, paz social são as urgências no Brasil.
A Igreja tem uma palavra a dizer sobre estes temas, porque, para responder
adequadamente a esses desafios, não são suficientes soluções meramente
técnicas, mas é preciso ter uma visão subjacente do homem, da sua liberdade, do
seu valor, da sua abertura ao transcendente. E vocês, queridos Irmãos, não
tenham medo de oferecer esta contribuição da Igreja que é para bem da sociedade
inteira e de oferecer esta palavra «encarnada» também com o testemunho.
A
Amazônia como teste decisivo, banco de prova para a Igreja e a sociedade
brasileiras
Há um último ponto sobre o qual gostava de deter-me e
que considero relevante para o caminho atual e futuro não só da Igreja no
Brasil, mas também de toda a estrutura social: a Amazônia. A Igreja está na
Amazônia , não como aqueles que têm as malas na mão para partir depois de terem
explorado tudo o que puderam. Desde o início que a Igreja está presente na
Amazônia com missionários, congregações religiosas, sacerdotes, leigos e
bispos, e lá continua presente e determinante no futuro daquela área. Penso no
acolhimento que a Igreja na Amazônia oferece hoje aos imigrantes haitianos
depois do terrível terremoto que devastou o seu país.
Queria convidar todos a refletirem sobre o que
Aparecida disse a propósito da Amazônia,[12] incluindo o forte apelo ao
respeito e à salvaguarda de toda a criação que Deus confiou ao homem, não para
que a explorasse rudemente, mas para que tornasse ela um jardim. No desafio
pastoral que representa a Amazônia, não posso deixar de agradecer o que a
Igreja no Brasil está fazendo: a Comissão Episcopal para a Amazônia, criada em
1997, já deu muitos frutos e tantas dioceses responderam pronta e generosamente
ao pedido de solidariedade, enviando missionários, leigos e sacerdotes.
Agradeço a Dom Jaime Chemelo, pioneiro deste trabalho, e ao Cardeal Hummes,
atual presidente da Comissão. Mas eu gostava de acrescentar que deveria ser
mais incentivada e relançada a obra da Igreja. Fazem falta formadores
qualificados, especialmente formadores e professores de teologia, para
consolidar os resultados alcançados no campo da formação de um clero autóctone,
inclusive para se ter sacerdotes adaptados às condições locais e consolidar por
assim dizer o «rosto amazônico» da Igreja. Nisto lhes peço, por favor, para
serem corajosos, para terem parresia! No modo «porteño» [de Buenos Aires] de
falar, lhes diria para serem destemidos.
Queridos Irmãos, procurei oferecer-lhes fraternalmente
reflexões e linhas de ação em uma Igreja como a que está no Brasil, que é um
grande mosaico de pequeninas pedras, de imagens, de formas, de problemas, de
desafios, mas que por isso mesmo é uma enorme riqueza. A Igreja não é jamais
uniformidade, mas diversidades que se harmonizam na unidade, e isso é válido em
toda a realidade eclesial.
Que a Virgem Imaculada Aparecida seja a estrela que
ilumina o compromisso e o caminho de vocês levarem Cristo, como Ela o fez, a
cada homem e cada mulher de seu imenso país. Será Ele, como fez com os dois discípulos
extraviados e desiludidos de Emaús, a aquecer o coração e a dar nova e segura
esperança.
[1] O Documento
de Aparecida sublinha como as crianças, os jovens e os idosos constroem o
futuro dos povos (cf. n. 447).
[2]
Penso em tantas figuras como – somente para citar algumas – Lorscheider,
Mendes de Almeida, Sales, Vital, Câmara, Macedo... juntamente com o primeiro
Bispo brasileiro, Pero Fernandes Sardinha (1551/1556), assassinado por
belicosas tribos locais.
[3] “Letter of
26 january 1833”, in: The letters and Diaries of John Henry Newman , vol. III,
Oxford 1979, p. 204.
[4] No Documento
de Aparecida, são apresentadas sinteticamente as razões de fundo deste fenómeno
(cf. n. 225).
[5] Cf. também os quatro pontos
indicados por Aparecida (ibid., n. 226).
[6] No Documento de Aparecida é
prestada grande atenção à formação do Clero, bem como dos leigos (cf. nn.
316-325; 212).
[7] Também sobre
este aspecto o Documento de Aparecida oferece directrizes importantes (cf. nn.
181-183; 189).
[8] Cf. n. 216.
[9] Cf. nn. 365-372.
[10] As conclusões da Conferência de
Aparecida insistem sobre o rosto de uma Igreja que é, por sua natureza,
evangelizadora; que existe para evangelizar, com audácia e liberdade, a todos
os níveis (cf. nn. 547-554).
[11] Cf. nn. 459-463.
[12] Cf. em particular os nn. 83-87
e, do ponto de vista de uma pastoral unitária, o n. 475.
14. ENTREVISTA À RÁDIO CATEDRAL DA
ARQUIDIOCESE DO RIO
Sábado, 27 de Julho de
2013
Na tarde desta
terça-feira, Papa Francisco visitou os estúdios da Rádio Catedral, mantida pela
Arquidiocese do Rio de Janeiro. Durante sua rápida participação, deixou uma
mensagem muito marcante sobre temas que delineiam as principais posições de
Francisco durante a Jornada Mundial da Juventude do Rio de Janeiro. Acompanhe o
texto na íntegra.
“Bom dia, boa tarde, a todos que estão ouvindo.
Agradeço a atenção e agradeço aqui aos integrantes da rádio pela amabilidade
por me darem o microfone. Agradeço e estou olhando para o rádio e vejo que,
hoje em dia, os meios de comunicação são muito importantes.
Eu diria que, uma rádio católica, hoje em dia, é o
púlpito mas próximo que temos de onde podemos anunciar os valores humanos, os
valores religiosos e, sobretudo, anunciar a Jesus Cristo, ao Senhor. Dar ao
Senhor essa graça de colocá-lo em nossas coisas.
Assim, saúdo a todos e agradeço todo o esforço que faz
esta arquidiocese para ter e manter uma rádio que tem uma rede tão grande. A
todos que estão me escutando, peço que rezem por mim, que rezem por esta rádio,
que rezem pelo bispo, que rezem pela arquidiocese, que todos possamos nos unir
na oração e que todos trabalhemos por uma cultura mais humanista, mais repleta
de valores e que não deixemos ninguém de fora.
Que todos trabalhemos por esta palavra que hoje em dia
não é bem aceita: solidariedade. É uma palavra que procuram deixar de lado,
sempre, porquê incômoda. Todavia, é uma palavra que reflete os valores humanos
e cristãos que hoje nos pedem para ir contra; da cultura do descartável, de que
tudo é descartável.
Uma cultura que sempre deixa as pessoas de fora: deixa
à margem as crianças, deixa à margem os jovens, deixa à margem os idosos, deixa
a fora aos que não servem, aos que não produzem, e isso não pode acontecer.
Invés, a solidariedade, coloca todos dentro. Devem seguir trabalhando por esta
cultura da solidariedade e pelo Evangelho”.
Ao responder
sobre a importância da família, Papa Francisco reiterou o caráter indissolúvel
desta.
“Não somente diria que a família é importante para a
evangelização do novo mundo. A família é importante, é necessária para a
sobrevivência da humanidade. Se não existe a família, a sobrevivência cultural
da humanidade corre perigo. É a base, nos apeteça ou não: a família”.
15. DISCURSO NA VIGÍLIA DE ORAÇÃO COM OS
JOVENS - COPACABANA
Sábado, 27 de Julho de
2013
Queridos jovens,
Contemplando vocês que hoje estão aqui presentes, me
vem à mente a história de São Francisco de Assis. Diante do Crucifixo, ele
escuta a voz de Jesus que lhe diz: «Francisco, vai e repara a minha casa». E o
jovem Francisco responde, com prontidão e generosidade, a esta chamada do
Senhor para reparar sua casa. Mas qual casa? Aos poucos, ele percebe que não se
tratava fazer de pedreiro para reparar um edifício feito de pedras, mas de dar
a sua contribuição para a vida da Igreja; era colocar-se ao serviço da Igreja,
amando-a e trabalhando para que transparecesse nela sempre mais a Face de
Cristo.
Também hoje o Senhor continua precisando de vocês,
jovens, para a sua Igreja. Queridos jovens, o Senhor precisa de vocês! Ele
também hoje chama a cada um de vocês para segui-lo na sua Igreja e ser
missionário. Hoje, queridos jovens, o Senhor lhes chama! Não em magote, mas um
a um… a cada um. Escutem no coração aquilo que lhes diz. Penso que podemos
aprender algo daquilo que sucedeu nestes dias: por causa do mau tempo, tivemos
de suspender a realização desta Vigília no “Campus Fidei”, em Guaratiba. Não
quererá porventura o Senhor dizer-nos que o verdadeiro “Campus Fidei”, o
verdadeiro Campo da Fé não é um lugar geográfico, mas somos nós mesmos? Sim, é
verdade! Cada um de nós, cada um de vocês, eu, todos. E ser discípulo
missionário significa saber que somos o Campo da Fé de Deus. Ora, partindo da
denominação Campo da Fé, pensei em três imagens que podem nos ajudar a entender
melhor o que significa ser um discípulo missionário: a primeira imagem, o campo
como lugar onde se semeia; a segunda, o campo como lugar de treinamento; e a
terceira, o campo como canteiro de obras.
1. Primeiro: o campo como lugar onde se semeia. Todos
conhecemos a parábola de Jesus sobre um semeador que saiu pelo campo lançando
sementes; algumas caem à beira do caminho, em meio às pedras, no meio de
espinhos e não conseguem se desenvolver; mas outras caem em terra boa e dão
muito fruto (cf. Mt 13,1-9). Jesus mesmo explica o sentido da parábola: a
semente é a Palavra de Deus que é lançada nos nossos corações (cf. Mt
13,18-23). Hoje – todos os dias, mas de forma especial hoje – Jesus semeia.
Quando aceitamos a Palavra de Deus, então somos o Campo da Fé! Por favor,
deixem que Cristo e a sua Palavra entrem na vida de vocês, deixem entrar a
semente da Palavra de Deus, deixem que germine, deixem que cresça. Deus faz
tudo, mas vocês deixem-no agir, deixem que Ele trabalhe neste crescimento!
Jesus nos diz que as sementes, que caíram à beira do
caminho, em meio às pedras e em meio aos espinhos não deram fruto. Creio que
podemos, com honestidade, perguntar-nos: Que tipo de terreno somos, que tipo de
terreno queremos ser? Quem sabe se, às vezes, somos como o caminho: escutamos o
Senhor, mas na nossa vida não muda nada, pois nos deixamos aturdir por tantos apelos
superficiais que escutamos. Eu pergunto-lhes, mas agora não respondam, cada um
responde no seu coração: Sou uma jovem, um jovem aturdido? Ou somos como o terreno pedregoso:
acolhemos Jesus com entusiasmo, mas somos inconstantes; diante das dificuldades, não temos a coragem
de ir contra a corrente. Cada um de nós responda no seu coração: Tenho coragem
ou sou um cobarde? Ou somos como o terreno com os espinhos: as coisas, as
paixões negativas sufocam em nós as palavras do Senhor (cf. Mt 13, 18-22). Em
meu coração, tenho o hábito de jogar em dois papéis: fazer bela figura com Deus
e fazer bela figura com o diabo? O hábito de querer receber a semente de Jesus
e, ao mesmo tempo, irrigar os espinhos e as ervas daninhas que nascem no meu
coração? Hoje, porém, eu tenho a certeza que a semente pode cair em terra boa.
Nos testemunhos, ouvimos como a semente caiu em terra boa. «Não, Padre, eu não
sou terra boa! Sou uma calamidade, estou cheio de pedras, de espinhos, de
tudo». Sim, pode suceder que à superfície seja assim, mas você liberte um
pedacinho, um bocado de terra boa e deixe que caia lá a semente e verá como vai
germinar. Eu sei que vocês querem ser terreno bom, cristãos de verdade; e não
cristãos pela metade, nem cristãos “engomadinhos”, cujo cheiro os denuncia pois
parecem cristãos mas no fundo, no fundo não fazem nada; nem cristãos de
fachada, cristãos que são “pura aparência”, mas sim cristãos autênticos. Sei
que vocês não querem viver na ilusão de uma liberdade inconsistente que se
deixa arrastar pelas modas e as conveniências do momento. Sei que vocês apostam
em algo grande, em escolhas definitivas que deem pleno sentido. É assim ou
estou enganado? É assim? Bem; se é assim, façamos uma coisa: todos, em
silêncio, fixemos o olhar no coração e cada um diga a Jesus que quer receber a
semente. Digam a Jesus: Vê, Jesus, as pedras que tem, vê os espinhos, vê as
ervas daninhas, mas vê este pedacinho de terra que te ofereço para que entre a
semente. Em silêncio, deixemos entrar a semente de Jesus. Lembrem-se deste
momento, cada um sabe o nome da semente que entrou. Deixem-na crescer, e Deus
cuidará dela.
2. O campo...O campo, para além de ser um lugar de
sementeira, é lugar de treinamento. Jesus nos pede que o sigamos por toda a
vida, pede que sejamos seus discípulos, que “joguemos no seu time”. A maioria
de vocês ama os esportes. E aqui no Brasil, como em outros países, o futebol é
paixão nacional. Sim ou não? Ora bem, o que faz um jogador quando é convocado
para jogar em um time? Deve treinar, e muito! Também é assim a nossa vida de
discípulos do Senhor. Descrevendo os cristãos, São Paulo nos diz: «Todo atleta
se impõe todo tipo de disciplina. Eles assim procedem, para conseguirem uma
coroa corruptível. Quanto a nós, buscamos uma coroa incorruptível!» (1Co 9, 25).
Jesus nos oferece algo superior à Copa do Mundo! Algo superior à Copa do Mundo!
Jesus oferece-nos a possibilidade de uma vida fecunda, de uma vida feliz e nos
oferece também um futuro com Ele que não terá fim, na vida eterna. É o que nos
oferece Jesus, mas pede para pagarmos a entrada; e a entrada é que treinemos
para estar “em forma”, para enfrentar, sem medo, todas as situações da vida,
testemunhando a nossa fé. Através do diálogo com Ele: a oração. Padre, agora
vai pôr-nos todos a rezar? Porque não? Pergunto-lhes… mas respondam no seu
coração, não em voz alta mas no silêncio: Eu rezo? Cada um responda. Eu falo
com Jesus ou tenho medo do silêncio? Deixo que o Espírito Santo fale no meu
coração? Eu pergunto a Jesus: Que queres que eu faça, que queres da minha vida?
Isto é treinar-se. Perguntem a Jesus, falem com Jesus. E se cometerem um erro
na vida, se tiverem uma escorregadela, se fizerem qualquer coisa de mal, não
tenham medo. Jesus, vê o que eu fiz! Que devo fazer agora? Mas falem sempre com
Jesus, no bem e no mal, quando fazem uma coisa boa e quando fazem uma coisa má.
Não tenham medo d’Ele! Esta é a oração. E assim treinam no diálogo com Jesus,
neste discipulado missionário! Através dos sacramentos, que fazem crescer em
nós a sua presença. Através do amor fraterno, do saber escutar, do compreender,
do perdoar, do acolher, do ajudar os demais, qualquer pessoa sem excluir nem
marginalizar ninguém. Queridos jovens, que vocês sejam verdadeiros “atletas de
Cristo”!
3. E terceiro: o campo como canteiro de obras. Aqui
mesmo vimos como se pôde construir uma igreja: indo e vindo, os jovens e as
jovens deram o melhor de si e construíram a Igreja. Quando o nosso coração é
uma terra boa que acolhe a Palavra de Deus, quando “se sua a camisa” procurando
viver como cristãos, nós experimentamos algo maravilhoso: nunca estamos
sozinhos, fazemos parte de uma família de irmãos que percorrem o mesmo caminho;
somos parte da Igreja. Esses jovens, essas jovens não estavam sós, mas, juntos,
fizeram um caminho e construíram a Igreja; juntos, realizaram o que fez São
Francisco: construir, reparar a Igreja. Eu lhes pergunto: Querem construir a
Igreja? [Sim…] Se animam uns aos outros a fazê-lo? [Sim…] E amanhã terão
esquecido este «sim» que disseram? [Não…] Assim gosto! Somos parte da Igreja;
mais ainda, tornamo-nos construtores da Igreja e protagonistas da história.
Jovens, por favor, não se ponham na «cauda» da história. Sejam protagonistas.
Joguem ao ataque! Chutem para diante, construam um mundo melhor, um mundo de
irmãos, um mundo de justiça, de amor, de paz, de fraternidade, de
solidariedade. Jogai sempre ao ataque! São Pedro nos diz que somos pedras vivas
que formam um edifício espiritual (cf. 1Pe 2,5). E, olhando para este palco,
vemos a miniatura de uma igreja, construída com pedras vivas. Na Igreja de
Jesus, nós somos as pedras vivas, e Jesus nos pede que construamos a sua
Igreja; cada um de nós é uma pedra viva, é um pedacinho da construção e, quando
vem a chuva, se faltar aquele pedacinho, temos infiltrações e entra a água na
casa. E não construam uma capelinha, onde cabe somente um grupinho de pessoas.
Jesus nos pede que a sua Igreja viva seja tão grande que possa acolher toda a
humanidade, que seja casa para todos! Ele diz a mim, a você, a cada um: «Ide e
fazei discípulos entre todas as nações»! Nesta noite, respondamos-lhe: Sim,
Senhor! Também eu quero ser uma pedra viva; juntos queremos edificar a Igreja
de Jesus! Eu quero ir e ser construtor da Igreja de Cristo! Atrevem-se a
repetir isto? Eu quero ir e ser construtor da Igreja de Cristo! Digam agora…
[os jovens repetem]. Depois devem se lembrar que o disseram juntos.
O coração de vocês, coração jovem, quer construir um
mundo melhor. Acompanho as notícias do mundo e vejo que muitos jovens, em
tantas partes do mundo, saíram pelas estradas para expressar o desejo de uma
civilização mais justa e fraterna. Os jovens nas estradas; são jovens que
querem ser protagonistas da mudança. Por favor, não deixem para outros o ser
protagonistas da mudança! Vocês são aqueles que tem o futuro! Vocês… Através de
vocês, entra o futuro no mundo. Também a vocês, eu peço para serem
protagonistas desta mudança. Continuem a vencer a apatia, dando uma resposta
cristã às inquietações sociais e políticas que estão surgindo em várias partes
do mundo. Peço-lhes para serem construtores do mundo, trabalharem por um mundo
melhor. Queridos jovens, por favor, não «olhem da sacada» a vida, entrem nela.
Jesus não ficou na sacada, mergulhou… «Não olhem da sacada» a vida, mergulhem
nela, como fez Jesus.
Resta, porém, uma pergunta: Por onde começamos? A quem
pedimos para iniciar isso? Por onde começamos? Uma vez perguntaram a Madre
Teresa de Calcutá o que devia mudar na Igreja; queremos começar, mas por qual
parede? Por onde – perguntaram a Madre Teresa – é preciso começar? Por ti e por
mim: respondeu ela. Tinha vigor aquela mulher! Sabia por onde começar. Hoje eu
roubo a palavra a Madre Teresa e digo também a você: Começamos? Por onde? Por
ti e por mim! Cada um, de novo em silêncio, se interrogue: se devo começar por
mim, por onde principio? Cada um abra o seu coração, para que Jesus lhe diga
por onde começar.
Queridos amigos, não se esqueçam: Vocês são o Campo da
Fé! Vocês são os atletas de Cristo! Vocês são os construtores de uma Igreja
mais bela e de um mundo melhor. Elevemos o olhar para Nossa Senhora. Ela nos
ajuda a seguir Jesus, nos dá o exemplo com o seu “sim” a Deus: «Eis aqui a
serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua Palavra» (Lc 1,38). Também nós o
dizemos a Deus, juntos com Maria: faça-se em mim segundo a Tua palavra. Assim
seja!
16. HOMILIA NA MISSA DE ENVIO DA JMJ NA
PRAIA DE COPACABANA
Domingo, 28 de Julho de
2013
Amados irmãos e
irmãs,
Queridos jovens!
«Ide e fazei discípulos entre todas as nações». Com
estas palavras, Jesus se dirige a cada um de vocês, dizendo: «Foi bom
participar nesta Jornada Mundial da Juventude, vivenciar a fé junto com jovens
vindos dos quatro cantos da terra, mas agora você deve ir e transmitir esta
experiência aos demais». Jesus lhe chama a ser um discípulo em missão! Hoje, à
luz da Palavra de Deus que acabamos de ouvir, o que nos diz o Senhor? Que nos
diz o Senhor? Três palavras: Ide, sem medo, para servir.
1. Ide. Durante estes dias, aqui no Rio, vocês puderam
fazer a bela experiência de encontrar Jesus e de encontrá-lo juntos, sentindo a
alegria da fé. Mas a experiência deste encontro não pode ficar trancafiada na
vida de vocês ou no pequeno grupo da paróquia, do movimento, da comunidade de
vocês. Seria como cortar o oxigênio a uma chama que arde. A fé é uma chama que
se faz tanto mais viva quanto mais é partilhada, transmitida, para que todos
possam conhecer, amar e professar que Jesus Cristo é o Senhor da vida e da
história (cf. Rm 10,9).
Mas, atenção! Jesus não disse: se vocês quiserem, se
tiverem tempo, vão; mas disse: «Ide e fazei discípulos entre todas as nações».
Partilhar a experiência da fé, testemunhar a fé, anunciar o Evangelho é o
mandato que o Senhor confia a toda a Igreja, também a você. É uma ordem, sim;
mas não nasce da vontade de domínio, da vontade de poder. Nasce da força do
amor, do fato que Jesus foi quem veio primeiro para junto de nós e não nos deu
somente um pouco de Si, mas se deu por inteiro, Ele deu a sua vida para nos
salvar e mostrar o amor e a misericórdia de Deus. Jesus não nos trata como
escravos, mas como pessoas livres, como amigos, como irmãos; e não somente nos
envia, mas nos acompanha, está sempre junto de nós nesta missão de amor.
Para onde Jesus nos manda? Não há fronteiras, não há
limites: envia-nos para todas as pessoas. O Evangelho é para todos, e não
apenas para alguns. Não é apenas para aqueles que parecem a nós mais próximos,
mais abertos, mais acolhedores. É para todas as pessoas. Não tenham medo de ir
e levar Cristo para todos os ambientes, até as periferias existenciais,
incluindo quem parece mais distante, mais indiferente. O Senhor procura a
todos, quer que todos sintam o calor da sua misericórdia e do seu amor.
De forma especial, queria que este mandato de Cristo
-“Ide” - ressoasse em vocês, jovens da Igreja na América Latina, comprometidos
com a Missão Continental promovida pelos Bispos. O Brasil, a América Latina, o
mundo precisa de Cristo! Paulo exclama: «Ai de mim se eu não pregar o evangelho!»
(1Co 9,16). Este Continente recebeu o anúncio do Evangelho, que marcou o seu
caminho e produziu muito fruto. Agora este anúncio é confiado também a vocês,
para que ressoe com uma força renovada. A Igreja precisa de vocês, do
entusiasmo, da criatividade e da alegria que lhes caracterizam! Um grande
apóstolo do Brasil, o Bem-aventurado José de Anchieta, partiu em missão quando
tinha apenas dezenove anos! Sabem qual é o melhor instrumento para evangelizar
os jovens? Outro jovem! Este é o caminho a ser percorrido por vocês!
2. Sem medo. Alguém poderia pensar: «Eu não tenho
nenhuma preparação especial, como é que posso ir e anunciar o Evangelho»?
Querido amigo, esse seu temor não é muito diferente do sentimento que teve
Jeremias – acabamos de ouvi-lo na leitura – quando foi chamado por Deus para
ser profeta: «Ah! Senhor Deus, eu não sei falar, sou muito novo». Deus responde
a vocês com as mesmas palavras dirigidas a Jeremias: «Não tenhas medo... pois
estou contigo para defender-te» (Jr 1,8). Deus está conosco!
«Não tenham medo!» Quando vamos anunciar Cristo, Ele
mesmo vai à nossa frente e nos guia. Ao enviar os seus discípulos em missão,
Jesus prometeu: «Eu estou com vocês todos os dias» (Mt 28,20). E isto é verdade
também para nós! Jesus nunca deixa ninguém sozinho! Sempre nos acompanha.
Além disso, Jesus não disse: «Vai», mas «Ide»: somos
enviados em grupo. Queridos jovens, sintam a companhia de toda a Igreja e
também a comunhão dos Santos nesta missão. Quando enfrentamos juntos os
desafios, então somos fortes, descobrimos recursos que não sabíamos que
tínhamos. Jesus não chamou os Apóstolos para que vivessem isolados; chamou-lhes
para que formassem um grupo, uma comunidade. Queria dar uma palavra também a
vocês, queridos sacerdotes, que concelebram comigo esta Eucaristia: vocês
vieram acompanhando os seus jovens, e é uma coisa bela partilhar esta
experiência de fé! Certamente isso lhes rejuvenesceu a todos. O jovem
contagia-nos com a sua juventude. Mas esta é apenas uma etapa do caminho. Por
favor, continuem acompanhando os jovens com generosidade e alegria, ajudem-lhes
a se comprometer ativamente na Igreja; que eles nunca se sintam sozinhos! E
aqui desejo agradecer cordialmente aos grupos de pastoral juvenil, aos
movimentos e novas comunidades que acompanham os jovens na sua experiência de
serem Igreja, tão criativos e tão audazes. Sigam em frente e não tenham medo!
3. A última palavra: para servir. No início do salmo
proclamado, escutamos estas palavras: «Cantai ao Senhor Deus um canto novo» (Sl
95, 1). Qual é este canto novo? Não são palavras, nem uma melodia, mas é o
canto da nossa vida, é deixar que a nossa vida se identifique com a vida de
Jesus, é ter os seus sentimentos, os seus pensamentos, as suas ações. E a vida
de Jesus é uma vida para os demais, a vida de Jesus é uma vida para os demais.
É uma vida de serviço.
São Paulo, na leitura que ouvimos há pouco, dizia: «Eu
me tornei escravo de todos, a fim de ganhar o maior número possível» (1 Cor 9,
19). Para anunciar Jesus, Paulo fez-se «escravo de todos». Evangelizar
significa testemunhar pessoalmente o amor de Deus, significa superar os nossos
egoísmos, significa servir, inclinando-nos para lavar os pés dos nossos irmãos,
tal como fez Jesus.
Três palavras: Ide, sem medo, para servir. Ide, sem
medo, para servir. Seguindo estas três palavras, vocês experimentarão que quem
evangeliza é evangelizado, quem transmite a alegria da fé, recebe mais alegria.
Queridos jovens, regressando às suas casas, não tenham medo de ser generosos
com Cristo, de testemunhar o seu Evangelho. Na primeira leitura, quando Deus
envia o profeta Jeremias, lhe dá o poder de «extirpar e destruir, devastar e
derrubar, construir e plantar» (Jr 1,10). E assim é também para vocês. Levar o
Evangelho é levar a força de Deus, para extirpar e destruir o mal e a
violência; para devastar e derrubar as barreiras do egoísmo, da intolerância e
do ódio; para construir um mundo novo. Queridos jovens, Jesus Cristo conta com
vocês! A Igreja conta com vocês! O Papa conta com vocês! Que Maria, Mãe de Jesus
e nossa Mãe, lhes acompanhe sempre com a sua ternura: «Ide e fazei discípulos
entre todas as nações». Amém.
17. ORAÇÃO DO ANGELUS – PRAIA DE
COPACABANA
Domingo, 28 de Julho de
2013
Amados irmãos e irmãs!
No término desta Celebração Eucarística, com a qual elevamos
a Deus o nosso canto de louvor e gratidão por todas as graças recebidas durante
esta Jornada Mundial da Juventude, quero ainda agradecer a Dom Orani Tempesta e
ao Cardeal Ryłko as palavras que me dirigiram. Agradeço também a vocês,
queridos jovens, por todas as alegrias que me deram nestes dias. Obrigado! Levo
vocês no meu coração!
Dirijamos agora o nosso olhar à Mãe do Céu, a Virgem
Maria. Nestes dias, Jesus lhes repetiu com insistência o convite para serem
seus discípulos-missionários; vocês escutaram a voz do Bom Pastor que lhes
chamou pelo nome e vocês reconheceram a voz que lhes chamava (cf. Jo 10,4). Não
é verdade que, nesta voz que ressoou nos seus corações, vocês sentiram a
ternura do amor de Deus? Não é verdade que vocês experimentaram a beleza de
seguir a Cristo, juntos, na Igreja? Não é verdade que vocês compreenderam
melhor que o Evangelho é a resposta ao desejo de uma vida ainda mais plena?
(cf. Jo 10,10). É verdade?
A Virgem Imaculada intercede por nós no Céu como uma
boa mãe que guarda os seus filhos. Maria nos ensina, com a sua existência, o
que significa ser discípulo missionário. Cada vez que rezamos o Ângelus,
recordamos o acontecimento que mudou para sempre a história dos homens. Quando
o anjo Gabriel anunciou a Maria que se tornaria a Mãe de Jesus, do Salvador,
Ela - mesmo sem compreender todo o significado daquele chamado - confiou em
Deus e respondeu: «Eis aqui a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua
palavra» (Lc 1,38). Mas, o que fez Maria logo em seguida? Após ter recebido a
graça de ser a Mãe do Verbo encarnado, não guardou para si aquele presente;
sentiu-se responsável e partiu, saiu da sua casa e foi, apressadamente, visitar
a sua parente Isabel que precisava de ajuda (cf. Lc 1, 38-39); cumpriu um gesto
de amor, de caridade e de serviço concreto, levando Jesus que trazia no ventre.
E se apressou a fazer este gesto!
Eis aqui, queridos amigos o nosso modelo. Aquela que
recebeu o dom mais precioso de Deus, como primeiro gesto de resposta, põe-se a
caminho para servir e levar Jesus. Peçamos a Nossa Senhora que também nos ajude
a transmitir a alegria de Cristo aos nossos familiares, aos nossos
companheiros, aos nossos amigos, a todas as pessoas. Nunca tenham medo de ser
generosos com Cristo! Vale a pena! Sair e ir com coragem e generosidade, para
que cada homem e cada mulher possa encontrar o Senhor.
Queridos jovens, temos encontro marcado na próxima
Jornada Mundial da Juventude, no ano de 2016 em Cracóvia, na Polônia. Pela
intercessão materna de Maria, peçamos a luz do Espírito Santo sobre o caminho
que nos levará a esta nova etapa de jubilosa celebração da fé e do amor de
Cristo.
18. ENCONTRO COM OS DIRIGENTES DO CELAM
Sábado, 28 de julho de
2013
1.
Introdução
Agradeço ao Senhor por esta oportunidade de poder falar
com vocês, Irmãos Bispos responsáveis do CELAM no quadriênio 2011-2015. Há 57
anos que o CELAM serve as 22 Conferências Episcopais da América Latina e do
Caribe, colaborando solidária e subsidiariamente para promover, incentivar e
dinamizar a colegialidade episcopal e a comunhão entre as Igrejas da Região e
seus Pastores.
Como vocês, também eu sou testemunha do forte impulso
do Espírito na V Conferência Geral do Episcopado da América Latina e do Caribe,
em Aparecida no mês de maio de 2007, que continua animando os trabalhos do
CELAM para a anelada renovação das Igrejas particulares. Em boa parte delas,
essa renovação já está em andamento. Gostaria de centrar esta conversação no
patrimônio herdado daquele encontro fraterno e que todos batizamos como Missão
Continental.
2.
Características peculiares de Aparecida
Existem quatro características típicas da referida V
Conferência. Constituem como que quatro colunas do desenvolvimento de Aparecida
que lhe dão a sua originalidade.
2.1)
Início sem documento
Medelín, Puebla e Santo Domingo começaram os seus
trabalhos com um caminho preparatório que culminou em uma espécie de
Instrumentum laboris, com base no qual se desenrolou a discussão, a reflexão e
a aprovação do documento final. Em vez disso, Aparecida promoveu a participação
das Igrejas particulares como caminho de preparação que culminou em um
documento de síntese. Este documento, embora tenha sido ponto de referência
durante a V Conferência Geral, não foi assumido como documento de partida. O
trabalho inicial foi pôr em comum as preocupações dos Pastores perante a
mudança de época e a necessidade de recuperar a vida de discípulo e missionário
com que Cristo fundou a Igreja.
2.2)
Ambiente de oração com o Povo de Deus
É importante lembrar o ambiente de oração gerado pela
partilha diária da Eucaristia e de outros momentos litúrgicos, tendo sido
sempre acompanhados pelo Povo de Deus. Além disso, realizando-se os trabalhos
na cripta do Santuário, a “música de fundo” que os acompanhava era constituída
pelos cânticos e as orações dos fiéis.
2.3)
Documento que se prolonga em compromisso, com a Missão Continental
Neste contexto de oração e vivência de fé, surgiu o
desejo de um novo Pentecostes para a Igreja e o compromisso da Missão
Continental. Aparecida não termina com um documento, mas prolonga-se na Missão
Continental.
2.4)
A presença de Nossa Senhora, Mãe da América
É a primeira Conferência do Episcopado da América
Latina e do Caribe que se realiza em um Santuário mariano.
3.
Dimensões da Missão Continental
A Missão Continental está projetada em duas dimensões:
programática e paradigmática. A missão programática, como o próprio nome
indica, consiste na realização de atos de índole missionária. A missão
paradigmática, por sua vez, implica colocar em chave missionária a atividade
habitual das Igrejas particulares. Em consequência disso, evidentemente,
verifica-se toda uma dinâmica de reforma das estruturas eclesiais. A “mudança
de estruturas” (de caducas a novas) não é fruto de um estudo de organização do
organograma funcional eclesiástico, de que resultaria uma reorganização
estática, mas é consequência da dinâmica da missão. O que derruba as estruturas
caducas, o que leva a mudar os corações dos cristãos é justamente a
missionariedade. Daqui a importância da missão paradigmática.
A Missão Continental, tanto programática como
paradigmática, exige gerar a consciência de uma Igreja que se organiza para
servir a todos os batizados e homens de boa vontade. O discípulo de Cristo não
é uma pessoa isolada em uma espiritualidade intimista, mas uma pessoa em
comunidade para se dar aos outros. Portanto, a Missão Continental implica
pertença eclesial.
Uma posição como esta, que começa pelo discipulado
missionário e implica entender a identidade do cristão como pertença eclesial,
pede que explicitemos quais são os desafios vigentes da missionariedade
discipular. Me limito a assinalar dois: a renovação interna da Igreja e o
diálogo com o mundo atual.
Renovação
interna da Igreja
Aparecida propôs como necessária a Conversão Pastoral.
Esta conversão implica acreditar na Boa Nova, acreditar em Jesus Cristo
portador do Reino de Deus, em sua irrupção no mundo, em sua presença vitoriosa
sobre o mal; acreditar na assistência e guia do Espírito Santo; acreditar na
Igreja, Corpo de Cristo e prolongamento do dinamismo da Encarnação.
Neste sentido, é necessário que nos interroguemos, como
Pastores, sobre o andamento das Igrejas a que presidimos. Estas perguntas
servem de guia para examinar o estado das dioceses quanto à adoção do espírito
de Aparecida, e são perguntas que é conveniente pôr-nos, muitas vezes, como
exame de consciência.
3.1. Procuramos que o nosso trabalho e o de nossos
presbíteros seja mais pastoral que administrativo? Quem é o principal
beneficiário do trabalho eclesial, a Igreja como organização ou o Povo de Deus
na sua totalidade?
3.2. Superamos a tentação de tratar de forma reativa os
problemas complexos que surgem? Criamos um hábito proativo? Promovemos espaços
e ocasiões para manifestar a misericórdia de Deus? Estamos conscientes da
responsabilidade de repensar as atitudes pastorais e o funcionamento das
estruturas eclesiais, buscando o bem dos fiéis e da sociedade?
3.3. Na prática, fazemos os fiéis leigos participantes
da Missão? Oferecemos a Palavra de Deus e os Sacramentos com consciência e
convicção claras de que o Espírito se manifesta neles?
3.4. Temos como critério habitual o discernimento
pastoral, servindo-nos dos Conselhos Diocesanos? Tanto estes como os Conselhos
paroquiais de Pastoral e de Assuntos Econômicos são espaços reais para a
participação laical na consulta, organização e planejamento pastoral? O bom
funcionamento dos Conselhos é determinante. Acho que estamos muito atrasados
nisso.
3.5. Nós, Pastores Bispos e Presbíteros, temos
consciência e convicção da missão dos fiéis e lhes damos a liberdade para irem
discernindo, de acordo com o seu processo de discípulos, a missão que o Senhor
lhes confia? Apoiamo-los e acompanhamos, superando qualquer tentação de
manipulação ou indevida submissão? Estamos sempre abertos para nos deixarmos
interpelar pela busca do bem da Igreja e da sua Missão no mundo?
3.6. Os agentes de pastoral e os fiéis em geral
sentem-se parte da Igreja, identificam-se com ela e aproximam-na dos batizados
indiferentes e afastados?
Como se pode ver, aqui estão em jogo atitudes. A
Conversão Pastoral diz respeito, principalmente, às atitudes e a uma reforma de
vida. Uma mudança de atitudes é necessariamente dinâmica: “entra em processo” e
só é possível moderá-lo acompanhando-o e discernindo-o. É importante ter sempre
presente que a bússola, para não se perder nesse caminho, é a identidade
católica concebida como pertença eclesial.
Diálogo
com o mundo atual
Faz-nos bem lembrar estas palavras do Concílio Vaticano
II: As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens do
nosso tempo, sobretudo dos pobres e atribulados, são também alegrias e
esperanças, tristezas e angústias dos discípulos de Cristo (cf. GS, 1). Aqui
reside o fundamento do diálogo com o mundo atual.
A resposta às questões existenciais do homem de hoje,
especialmente das novas gerações, atendendo à sua linguagem, entranha uma
mudança fecunda que devemos realizar com a ajuda do Evangelho, do Magistério e
da Doutrina Social da Igreja. Os cenários e areópagos são os mais variados. Por
exemplo, em uma mesma cidade, existem vários imaginários coletivos que
configuram “diferentes cidades”. Se continuarmos apenas com os parâmetros da
“cultura de sempre”, fundamentalmente uma cultura de base rural, o resultado
acabará anulando a força do Espírito Santo. Deus está em toda a parte: há que
saber descobri-lo para poder anunciá-lo no idioma dessa cultura; e cada
realidade, cada idioma tem um ritmo diferente.
4.
Algumas tentações contra o discipulado missionário
A opção pela missionariedade do discípulo sofrerá
tentações. É importante saber por onde entra o espírito mau, para nos ajudar no
discernimento. Não se trata de sair à caça de demônios, mas simplesmente de
lucidez e prudência evangélicas. Limito-me a mencionar algumas atitudes que configuram
uma Igreja “tentada”. Trata-se de conhecer determinadas propostas atuais que
podem mimetizar-se em a dinâmica do discipulado missionário e deter, até
fazê-lo fracassar, o processo de Conversão Pastoral.
4.1. A ideologização da mensagem evangélica. É uma
tentação que se verificou na Igreja desde o início: procurar uma hermenêutica
de interpretação evangélica fora da própria mensagem do Evangelho e fora da
Igreja. Um exemplo: a dado momento, Aparecida sofreu essa tentação sob a forma
de assepsia. Foi usado, e está bem, o método de “ver, julgar, agir” (cf. n.º
19). A tentação se encontraria em optar por um “ver” totalmente asséptico, um
“ver” neutro, o que não é viável. O ver está sempre condicionado pelo olhar.
Não há uma hermenêutica asséptica. Então a pergunta era: Com que olhar vamos
ver a realidade? Aparecida respondeu: Com o olhar de discípulo. Assim se
entendem os números 20 a 32. Existem outras maneiras de ideologização da
mensagem e, atualmente, aparecem na América Latina e no Caribe propostas desta
índole. Menciono apenas algumas:
a) O reducionismo socializante. É a ideologização mais
fácil de descobrir. Em alguns momentos, foi muito forte. Trata-se de uma
pretensão interpretativa com base em uma hermenêutica de acordo com as ciências
sociais. Engloba os campos mais variados, desde o liberalismo de mercado até à
categorização marxista.
b) A ideologização psicológica. Trata-se de uma
hermenêutica elitista que, em última análise, reduz o “encontro com Jesus
Cristo” e seu sucessivo desenvolvimento a uma dinâmica de autoconhecimento.
Costuma verificar-se principalmente em cursos de espiritualidade, retiros
espirituais, etc. Acaba por resultar numa posição imanente auto-referencial.
Não tem sabor de transcendência, nem portanto de missionariedade.
c) A proposta gnóstica. Muito ligada à tentação
anterior. Costuma ocorrer em grupos de elites com uma proposta de
espiritualidade superior, bastante desencarnada, que acaba por desembocar em
posições pastorais de “quaestiones disputatae”. Foi o primeiro desvio da
comunidade primitiva e reaparece, ao longo da história da Igreja, em edições
corrigidas e renovadas. Vulgarmente são denominados “católicos iluminados” (por
serem atualmente herdeiros do Iluminismo).
d) A proposta pelagiana. Aparece fundamentalmente sob a
forma de restauracionismo. Perante os males da Igreja, busca-se uma solução
apenas na disciplina, na restauração de condutas e formas superadas que, mesmo
culturalmente, não possuem capacidade significativa. Na América Latina, costuma
verificar-se em pequenos grupos, em algumas novas Congregações Religiosas, em
tendências para a “segurança” doutrinal ou disciplinar. Fundamentalmente é
estática, embora possa prometer uma dinâmica para dentro: regride. Procura
“recuperar” o passado perdido.
4.2. O funcionalismo. A sua ação na Igreja é
paralisante. Mais do que com a rota, se entusiasma com o “roteiro”. A concepção
funcionalista não tolera o mistério, aposta na eficácia. Reduz a realidade da
Igreja à estrutura de uma ONG. O que vale é o resultado palpável e as
estatísticas. A partir disso, chega-se a todas as modalidades empresariais de
Igreja. Constitui uma espécie de “teologia da prosperidade” no organograma da
pastoral.
4.3. O clericalismo é também uma tentação muito atual
na América Latina. Curiosamente, na maioria dos casos, trata-se de uma
cumplicidade viciosa: o sacerdote clericaliza e o leigo lhe pede por favor que
o clericalize, porque, no fundo, lhe resulta mais cômodo. O fenômeno do
clericalismo explica, em grande parte, a falta de maturidade adulta e de
liberdade cristã em boa parte do laicato da América Latina: ou não cresce (a
maioria), ou se abriga sob coberturas de ideologizações como as indicadas, ou
ainda em pertenças parciais e limitadas. Em nossas terras, existe uma forma de
liberdade laical através de experiências de povo: o católico como povo. Aqui
vê-se uma maior autonomia, geralmente sadia, que se expressa fundamentalmente
na piedade popular. O capítulo de Aparecida sobre a piedade popular descreve,
em profundidade, essa dimensão. A proposta dos grupos bíblicos, das comunidades
eclesiais de base e dos Conselhos pastorais está na linha de superação do
clericalismo e de um crescimento da responsabilidade laical.
Poderíamos continuar descrevendo outras tentações
contra o discipulado missionário, mas acho que estas são as mais importantes e
com maior força neste momento da América Latina e do Caribe.
5.
Algumas orientações eclesiológicas
5.1. O discipulado-missionário que Aparecida propôs às
Igrejas da América Latina e do Caribe é o caminho que Deus quer para “hoje”.
Toda a projeção utópica (para o futuro) ou restauracionista (para o passado)
não é do espírito bom. Deus é real e se manifesta no “hoje”. A sua presença, no
passado, se nos oferece como “memória” da saga de salvação realizada quer em
seu povo quer em cada um de nós; no futuro, se nos oferece como “promessa” e
esperança. No passado, Deus esteve lá e deixou sua marca: a memória nos ajuda
encontrá-lo; no futuro, é apenas promessa… e não está nos mil e um
“futuríveis”. O “hoje” é o que mais se parece com a eternidade; mais ainda: o
“hoje” é uma centelha de eternidade. No “hoje”, se joga a vida eterna.
O discipulado missionário é vocação: chamada e convite.
Acontece em um “hoje”, mas “em tensão”. Não existe o discipulado missionário
estático. O discípulo missionário não pode possuir-se a si mesmo; a sua
imanência está em tensão para a transcendência do discipulado e para a
transcendência da missão. Não admite a auto-referencialidade: ou refere-se a
Jesus Cristo ou refere-se às pessoas a quem deve levar o anúncio dele. Sujeito
que se transcende. Sujeito projetado para o encontro: o encontro com o Mestre
(que nos unge discípulos) e o encontro com os homens que esperam o anúncio.
Por isso, gosto de dizer que a posição do discípulo
missionário não é uma posição de centro, mas de periferias: vive em tensão para
as periferias… incluindo as da eternidade no encontro com Jesus Cristo. No
anúncio evangélico, falar de “periferias existenciais” descentraliza e,
habitualmente, temos medo de sair do centro. O discípulo-missionário é um
descentrado: o centro é Jesus Cristo, que convoca e envia. O discípulo é
enviado para as periferias existenciais.
5.2. A Igreja é instituição, mas, quando se erige em
“centro”, se funcionaliza e, pouco a pouco, se transforma em uma ONG. Então, a
Igreja pretende ter luz própria e deixa de ser aquele “mysterium lunae” de que
nos falavam os Santos Padres. Torna-se cada vez mais auto-referencial, e se
enfraquece a sua necessidade de ser missionária. De “Instituição” se transforma
em “Obra”. Deixa de ser Esposa, para acabar sendo Administradora; de Servidora
se transforma em “Controladora”. Aparecida quer uma Igreja Esposa, Mãe,
Servidora, facilitadora da fé e não controladora da fé.
5.3. Em Aparecida, verificam-se de forma relevante duas
categorias pastorais, que surgem da própria originalidade do Evangelho e nos
podem também servir de orientação para avaliar o modo como vivemos
eclesialmente o discipulado missionário: a proximidade e o encontro. Nenhuma
das duas é nova, antes configuram a maneira como Deus se revelou na história. É
o “Deus próximo” do seu povo, proximidade que chega ao máximo quando Ele
encarna. É o Deus que sai ao encontro do seu povo. Na América Latina e no
Caribe, existem pastorais “distantes”, pastorais disciplinares que privilegiam
os princípios, as condutas, os procedimentos organizacionais… obviamente sem
proximidade, sem ternura, nem carinho. Ignora-se a “revolução da ternura”, que
provocou a encarnação do Verbo. Há pastorais posicionadas com tal dose de
distância que são incapazes de conseguir o encontro: encontro com Jesus Cristo,
encontro com os irmãos. Este tipo de pastoral pode, no máximo, prometer uma
dimensão de proselitismo, mas nunca chegam a conseguir inserção nem pertença
eclesial. A proximidade cria comunhão e pertença, dá lugar ao encontro. A
proximidade toma forma de diálogo e cria uma cultura do encontro. Uma pedra de
toque para aferir a proximidade e a capacidade de encontro de uma pastoral é a
homilia. Como são as nossas homilias? Estão próximas do exemplo de Nosso
Senhor, que “falava como quem tem autoridade”, ou são meramente prescritivas,
distantes, abstratas?
5.4. Quem guia a pastoral, a Missão Continental (seja
programática seja paradigmática), é o Bispo. Ele deve guiar, que não é o mesmo
que comandar. Além de assinalar as grandes figuras do episcopado
latino-americano que todos nós conhecemos, gostaria de acrescentar aqui algumas
linhas sobre o perfil do Bispo, que já disse aos Núncios na reunião que tivemos
em Roma. Os Bispos devem ser Pastores, próximos das pessoas, pais e irmãos, com
grande mansidão: pacientes e misericordiosos. Homens que amem a pobreza, quer a
pobreza interior como liberdade diante do Senhor, quer a pobreza exterior como
simplicidade e austeridade de vida. Homens que não tenham “psicologia de
príncipes”. Homens que não sejam ambiciosos e que sejam esposos de uma Igreja
sem viver na expectativa de outra. Homens capazes de vigiar sobre o rebanho que
lhes foi confiado e cuidando de tudo aquilo que o mantém unido: vigiar sobre o
seu povo, atento a eventuais perigos que o ameacem, mas sobretudo para cuidar
da esperança: que haja sol e luz nos corações. Homens capazes de sustentar com
amor e paciência os passos de Deus em seu povo. E o lugar onde o Bispo pode
estar com o seu povo é triplo: ou à frente para indicar o caminho, ou no meio
para mantê-lo unido e neutralizar as debandadas, ou então atrás para evitar que
alguém se desgarre mas também, e fundamentalmente, porque o próprio rebanho tem
o seu olfato para encontrar novos caminhos.
Não quero juntar mais detalhes sobre a pessoa do Bispo,
mas simplesmente acrescentar, incluindo-me a mim mesmo nesta afirmação, que
estamos um pouco atrasados no que a Conversão Pastoral indica. Convém que nos
ajudemos um pouco mais a dar os passos que o Senhor quer que cumpramos neste
“hoje” da América Latina e do Caribe. E seria bom começar por aqui.
Agradeço-lhes a paciência de me ouvirem. Desculpem a
desordem do discurso e lhes peço, por favor, para tomarmos a sério a nossa
vocação de servidores do povo santo e fiel de Deus, porque é nisso que se
exerce e mostra a autoridade: na capacidade de serviço. Muito obrigado! (Fonte:
http://papa.cancaonova.com/discurso-do-papa-francisco-aos-dirigentes-do-celam/)
19. ENCONTRO COM OS VOLUNTÁRIOS DA XXVIII
JMJ
Pavilhão 5 do Rio Centro,
Rio de Janeiro
Domingo, 28 de Julho de
2013
Queridos voluntários, boa tarde!
Não podia regressar a Roma sem antes agradecer, de modo
pessoal e afetuoso, a cada um de vocês pelo trabalho e dedicação com que
acompanharam, ajudaram, serviram aos milhares de jovens peregrinos; pelos
inúmeros pequenos detalhes que fizeram desta Jornada Mundial da Juventude uma
experiência inesquecível de fé. Com os sorrisos de cada um de vocês, com a
gentileza, com a disponibilidade ao serviço, vocês provaram que "há maior
alegria em dar do que em receber" (At 20,35).
O serviço que vocês realizaram nestes dias me lembrou
da missão de São João Batista, que preparou o caminho para Jesus. Cada um, a
seu modo, foi um instrumento para que milhares de jovens tivessem o “caminho
preparado” para encontrar Jesus. E esse é o serviço mais bonito que podemos
realizar como discípulos missionários: preparar o caminho para que todos possam
conhecer, encontrar e amar o Senhor. A vocês que, neste período, responderam
com tanta prontidão e generosidade ao chamado para ser voluntários na Jornada
Mundial, queria dizer: sejam sempre generosos com Deus e com os demais. Não se
perde nada; ao contrário, é grande a riqueza da vida que se recebe!
Deus chama para escolhas definitivas, Ele tem um
projeto para cada um: descobri-lo, responder à própria vocação é caminhar para
a realização feliz de si mesmo. A todos Deus nos chama à santidade, a viver a
sua vida, mas tem um caminho para cada um. Alguns são chamados a se santificar
constituindo uma família através do sacramento do Matrimônio. Há quem diga que
hoje o casamento está “fora de moda”. Está fora de moda? [Não…]. Na cultura do
provisório, do relativo, muitos pregam que o importante é “curtir” o momento,
que não vale a pena comprometer-se por toda a vida, fazer escolhas definitivas,
“para sempre”, uma vez que não se sabe o que reserva o amanhã. Em vista disso
eu peço que vocês sejam revolucionários, eu peço que vocês vão contra a
corrente; sim, nisto peço que se rebelem: que se rebelem contra esta cultura do
provisório que, no fundo, crê que vocês não são capazes de assumir
responsabilidades, crê que vocês não são capazes de amar de verdade. Eu tenho
confiança em vocês, jovens, e rezo por vocês. Tenham a coragem de “ir contra a
corrente”. E tenham também a coragem de ser felizes!
O Senhor chama alguns ao sacerdócio, a se doar a Ele de
modo mais total, para amar a todos com o coração do Bom Pastor. A outros, chama
para servir os demais na vida religiosa: nos mosteiros, dedicando-se à oração
pelo bem do mundo, nos vários setores do apostolado, gastando-se por todos,
especialmente os mais necessitados. Nunca me esquecerei daquele 21 de setembro
– eu tinha 17 anos – quando, depois de passar pela igreja de San José de Flores
para me confessar, senti pela primeira vez que Deus me chamava. Não tenham medo
daquilo que Deus lhes pede! Vale a pena dizer “sim” a Deus. N’Ele está a
alegria!
Queridos jovens, talvez algum de vocês ainda não veja
claramente o que fazer da sua vida. Peça isso ao Senhor; Ele lhe fará entender
o caminho. Como fez o jovem Samuel, que ouviu dentro de si a voz insistente do
Senhor que o chamava, e não entendia, não sabia o que dizer, mas, com a ajuda
do sacerdote Eli, no final respondeu àquela voz: Senhor, fala eu escuto (cf.
1Sm 3,1-10) . Peçam vocês também a Jesus: Senhor, o que quereis que eu faça,
que caminho devo seguir?
Caros amigos, novamente lhes agradeço por tudo o que
fizeram nestes dias. Agradeço aos grupos pastorais, aos movimentos e novas
comunidades que colocaram seus membros ao serviço desta Jornada. Obrigado! Não
se esqueçam de nada do que vocês viveram aqui! Podem contar sempre com minhas
orações, e sei que posso contar com as orações de vocês. Uma última coisa:
rezem por mim.
20. DISCURSO NA CERIMÔNIA DE DESPEDIDA NO
AEROPORTO DO GALEÃO
Domingo, 28 de Julho de
2013
Senhor Vice-Presidente da República,
Distintas Autoridade Nacionais, Estaduais e Locais,
Senhor Arcebispo de São Sebastião do Rio de Janeiro,
Senhores Cardeais e Irmãos no Episcopado,
Queridos Amigos!
Dentro de alguns instantes, deixarei sua Pátria para
regressar a Roma. Parto com a alma cheia de recordações felizes; essas – estou
certo – tornar-se-ão oração. Neste momento, já começo a sentir saudades.
Saudades do Brasil, este povo tão grande e de grande coração; este povo tão
amoroso. Saudades do sorriso aberto e sincero que vi em tantas pessoas,
saudades do entusiasmo dos voluntários. Saudades da esperança no olhar dos
jovens no Hospital São Francisco. Saudades da fé e da alegria em meio à
adversidade dos moradores de Varginha. Tenho a certeza de que Cristo vive e
está realmente presente no agir de tantos e tantas jovens e demais pessoas que
encontrei nesta inesquecível semana. Obrigado pelo acolhimento e o calor da
amizade que me foram demonstrados. Também disso começo a sentir saudades.
De modo particular agradeço à Senhora Presidenta, aqui
representada por seu Vice-Presidente, por ter-se feito intérprete dos
sentimentos de todo o povo do Brasil para com o Sucessor de Pedro. Cordialmente
agradeço a meus Irmãos Bispos e seus inúmeros colaboradores por terem tornado
estes dias uma celebração estupenda da nossa fé fecunda e jubilosa em Jesus
Cristo. Agradeço, em especial, a Dom Orani Tempesta, Arcebispo do Rio de
Janeiro, seus Bispos Auxiliares, e Dom Raymundo Damasceno, Presidente da
Conferência Episcopal. Agradeço a todos os que tomaram parte nas celebrações da
Eucaristia e nos restantes eventos, àqueles que os organizaram, a quantos
trabalharam para difundi-los através da mídia. Agradeço, enfim, a todas as
pessoas que, de um modo ou outro, souberam acudir às necessidades de acolhida e
gestão de uma multidão imensa de jovens, sem esquecer de tantas pessoas que, no
silêncio e na simplicidade, rezaram para que esta Jornada Mundial da Juventude
fosse uma verdadeira experiência de crescimento na fé. Que Deus recompense a
todos, como só Ele sabe fazer!
Neste clima de gratidão e saudades, penso nos jovens,
protagonistas desse grande encontro: Deus lhes abençoe por tão belo testemunho
de participação viva, profunda e alegre nestes dias! Muitos de vocês vieram
como discípulos nesta peregrinação; não tenho dúvida de que todos agora partem
como missionários. A partir do testemunho de alegria e de serviço de vocês,
façam florescer a civilização do amor. Mostrem com a vida que vale a pena
gastar-se por grandes ideais, valorizar a dignidade de cada ser humano, e
apostar em Cristo e no seu Evangelho. Foi Ele que viemos buscar nestes dias,
porque Ele nos buscou primeiro, Ele nos faz arder o coração para anunciar a Boa
Nova nas grandes metrópoles e nos pequenos povoados, no campo e em todos os
locais deste nosso vasto mundo. Continuarei a nutrir uma esperança imensa nos
jovens do Brasil e do mundo inteiro: através deles, Cristo está preparando uma
nova primavera em todo o mundo. Eu vi os primeiros resultados desta sementeira;
outros rejubilarão com a rica colheita!
O meu pensamento final, minha última expressão das
saudades, dirige-se a Nossa Senhora Aparecida. Naquele amado Santuário,
ajoelhei-me em prece pela humanidade inteira e, de modo especial, por todos os
brasileiros. Pedi a Maria que robusteça em vocês a fé cristã, que é parte da
nobre alma do Brasil, como também de muitos outros países, tesouro de sua
cultura, alento e força para construírem uma nova humanidade na concórdia e na
solidariedade.
O Papa vai embora e lhes diz “até breve”, um “até
breve” com saudades, e lhes pede, por favor, que não se esqueçam de rezar por
ele. Este Papa precisa da oração de todos vocês. Um abraço para todos. Que Deus
lhes abençoe!
21. ENTREVISTA AOS JORNALISTAS NO VOO DE
RETORNO A ROMA
28 de julho de 2013
Fonte:
Folha Online (http://www1.folha.uol.com.br/poder/2013/07/1318313-se-uma-pessoa-e-gay-e-busca-deus-quem-sou-eu-para-julga-lo-diz-papa.shtml)
1)
Pergunta - Nestes quatro meses, o senhor criou várias comissões. Que tipo de
reforma tem em mente? O sr. quer suprimir o banco do Vaticano?
Papa
Francisco - Os passos que eu fui dando nestes quatro
meses e meio vão em duas vertentes. O conteúdo do que quero fazer vem da
congregação dos cardeais. Eu me lembro que os cardeais pediam muitas coisas
para o novo papa, antes do conclave. Eu me lembro de que tinha muita coisa. Por
exemplo, a comissão de oito cardeais, a importância de ter uma consulta
externa, e não uma consulta apenas interna.
Isso vai na linha do
amadurecimento da sinodalidade e do primado. Os vários episcopados do mundo vão
se expressando em muitas propostas que foram feitas, como a reforma da
secretaria dos sínodos, que a comissão sinodal tenha característica de
consultas, como o consistório cardinalício com temáticas específicas, como a
canonização.
A vertente dos conteúdos
vem daí. A segunda é a oportunidade. A formação da primeira comissão não me
custou pouco mais de um mês. Pensava em tratar a parte econômica no ano que
vem, porque não é a mais importante. Mas a agenda mudou devido a circunstâncias
que vocês conhecem.
O primeiro é o problema do
IOR [banco do Vaticano], como encaminhá-lo, como reformá-lo, como sanear o que
há de ser sanado. E essa foi então a primeira comissão.
Depois, tivemos a comissão
dos 15 cardeais que se ocupam dos assuntos econômicos da Santa Sé. E por isso
decidimos fazer uma comissão para toda a economia da Santa Sé, uma única
comissão de referência. Notou-se que o problema econômico estava fora da
agenda. Mas essas coisas atendem.
Quando estamos no governo,
vamos por um lado, mas, se chutam e fazem um golaço por outro lado, temos de
atacar. A vida é assim. Eu não sei como o IOR vai ficar. Alguns acham melhor
que seja um banco, outros que seja um fundo, uma instituição de ajuda. Eu não
sei. Eu confio no trabalho das pessoas que estão trabalhando sobre isso.
O presidente do IOR
permanence, o tesoureiro também, enquanto o diretor e o vice-diretor pediram
demissão. Não sei como vai terminar essa história. E isso é bom. Não somos
máquinas. Temos de achar o melhor. A característica de, seja o que for, tem de
ter transparência e honestidade.
2) Uma fotografia do sr. deu a volta ao mundo, quando o sr. desceu as
escadas do helicóptero, carregando sua mala preta. Artigos de todo o mundo
comentaram o papa que sai com sua própria mala. Foram levantadas hipóteses
também sobre o conteúdo da mala. Por que o sr. saiu carregando a maleta preta,
e não seus colaboradores? E o sr. poderia dizer o que tinha dentro?
Não tinha a chave da bomba
atômica. Eu sempre fiz isso, Quando viajo, levo minhas coisas. E dentro o que
tem? Um barbeador, um breviário (livro de liturgia), uma agenda, tinha um livro
para ler, sobre Santa Terezinha. Sou devoto de Santa Terezinha. Eu sempre levei
a minha maleta. É normal. Temos de ser normais. É um pouco estranho isso que
você me diz que a foto deu a volta ao mundo. Mas temos de nos habituar a sermos
normais, à normalidade da vida.
3) Por que o senhor pede tanto para que rezem
pelo senhor? Não é habitual ouvir de um papa que peça que rezem por ele.
Sempre pedi isso. Quando
era padre, pedia, mas nem tanto nem tão frequentemente. Comecei a pedir mais
frequentemente quando passei a bispo. Porque eu sinto que, se o Senhor não
ajuda nesse trabalho de ajudar aos outros, não se pode. Preciso da ajuda do
Senhor. Eu de verdade me sinto com tantos limites, tantos problemas, e também
pecador. Peço a Nossa Senhora que reze por mim. É um hábito, mas que vem da
necessidade. Sinto que devo pedir. Não sei
4)
Na busca por fazer essas mudanças, o sr. disse que existem muitos santos que
trabalham no Vaticano e outros um pouco menos santos. O sr. enfrenta
resistências a essa sua vontade de mudar as coisas no Vaticano? O sr. vive num
ambiente muito austero, de Santa Marta. Os seus colaboradores também vivem essa
austeridade? Isso é algo apenas do sr. ou da comunidade?
As mudanças vêm de duas
vertentes: do que pediram os cardeais e também o que vem da minha
personalidade. Você falou que eu fico na Santa Marta. Eu não poderia viver
sozinho no palácio, que não é luxuoso. O apartamento pontifício é grande, mas
não é luxuoso. Mas eu não posso viver sozinho. Preciso de gente, falar com
gente. Trabalhar com as pessoas. Porque, quando os meninos da escola jesuíta me
perguntaram se eu estava aqui pela austeridade e pobreza, eu respondi:
"Não, por motivos psiquiátricos."
Psicologicamente, não
posso. Cada um deve levar adiante sua vida, seguir seu modo de vida. Os
cardeais que trabalham na Cúria não vivem como ricos. Têm apartamentos
pequenos. São austeros. Os que eu conheço têm apartamentos pequenos.
Cada um tem de viver como
o Senhor disse que tem de viver. A austeridade é necessária para todos.
Trabalhamos a serviço da igreja. É verdade que há santos, sacerdotes, padres,
gente que prega, que trabalha tanto, que vai aos pobres, se preocupa de fazer
comer os pobres. Têm santos na Cúria. Também têm alguns que não têm muitos
santos. E são estes que fazem mais barulho. Uma árvore que cai faz mais barulho
do que uma floresta que nasce. Isso me dói. Porque são alguns que causam
escândalos. São escândalos que fazem mal. Uma coisa que nunca disse: a Cúria
deveria ter o nível que tinha dos velhos padres, pessoas que trabalham. Os
velhos membros da Cúria. Precisamos deles. Precisamos o perfil do velho da
Cúria.
Sobre resistência, se tem,
ainda não vi. É verdade que aconteceram muitas coisas. Mas eu preciso dizer: eu
encontrei ajuda, encontrei pessoas leais. Por exemplo, eu gosto quando alguém
me diz :"Eu não estou de acordo". Esse é um verdadeiro colaborador.
Mas, quando vejo aqueles que dizem "ah, que belo, que belo" e depois
dizem o contrario por trás, isso não ajuda.
5)
O mundo mudou, os jovens mudaram. Temos no Brasil muitos jovens, mas o senhor
não falou de aborto, sobre a posição do Vaticano em relação ao casamento entre pessoas
do mesmo sexo. No Brasil foram aprovadas leis que ampliam os direitos para
estes casamentos em relação ao aborto. Por que o senhor não falou sobre isso?
A igreja já se expressou
perfeitamente sobre isso. Eu não queria voltar sobre isso. Não era necessário
voltar sobre isso, como também não era necessário falar sobre outros assuntos.
Eu também não falei sobre o roubo, sobre a mentira. Para isso, a igreja tem uma
doutrina clara. Queria falar de coisas positivas, que abrem caminho aos jovens.
Além disso, os jovens sabem perfeitamente qual a posição da igreja.
6)
E a do papa?
É a da Igreja, eu sou
filho da Igreja.
7)
Qual o sentido mais profundo de se apresentar como o bispo de Roma?
Não se deve andar mais
adiante do que o que se fala. O papa é bispo de Roma e por isso é papa, o
sucessor de Pedro. Não é o caso pensar que isso quer dizer que é o primeiro.
Não é esse o sentido. O primeiro sentido do papa é ser o bispo de Roma.
8)
O sr. teve sua primeira experiência multidinária no Rio. Como se sente como papa,
é um trabalho duro?
Ser bispo é belo. O
problema é quando alguém busca ter esse trabalho, assim não é tão belo. Mas,
quando o Senhor chama para ser biso, isso é belo. Tem sempre o perigo e o
pecado de pensar com superioridade, como se fosse um príncipe. Mas o trabalho é
belo. Ajudar o irmão a ir adiante. Têm o filtro da estrada.
O bispo tem de indicar o
caminho. Eu gosto de ser bispo. Em Buenos Aires, eu era tão feliz. Como padre,
era feliz. Como bispo, era feliz e isso me faz bem.
9)
E ser papa?
Se você faz o que o Senhor
quer, é feliz. Esse é meu sentimento.
10)
A Igreja no Brasil está perdendo fieis. A Renovação Carismática é uma
possibilidade para evitar que eles sigam para as igrejas pentecostais?
É verdade, as estatísticas
mostram. Falamos sobre isso ontem com os bispos brasileiros. E isso é um
problema que incomoda os bispos brasileiros.
Eu vou dizer uma coisa:
nos anos 1970, início dos 1980, eu não podia nem vê-los. Uma vez, falando sobre
eles, disse a seguinte frase: eles confundem uma celebração musical com uma
escola de samba.
Eu me arrependi. Vi que os
movimentos bem assessorados trilharam um bom caminho. Agora, vejo que esse
movimento faz muito bem à igreja em geral. Em Buenos Aires, eu fazia uma missa
com eles uma vez por ano, na catedral. Vi o bem que eles faziam.
Neste momento da igreja,
creio que os movimentos são necessários. Esses movimentos são um graça para a
igreja. A Renovação Carismática não serve apenas para evitar que alguns sigam
os pentecostais. Eles são importantes para a própria igreja, a igreja que se
renova.
11)
A igreja sem a mulher perde a fecundidade? Quais as medidas concretas? O senhor
disse que está cansado. Há algum tratamento especial neste voo?
Vamos começar pelo fim.
Não há nenhum tratamento especial neste voo. Na frente, tem uma bela poltrona.
Escrevi para dizer que não queria tratamento especial.
Segundo, as mulheres. Uma
igreja sem as mulheres é como o colégio apostólico sem Maria. O papal da mulher
na igreja não é só maternidade, a mãe da família. É muito mais forte. A mulher
ajuda a igreja a crescer. E pensar que a Nossa Senhora é mais importante do que
os apóstolos! A igreja é feminina, esposa, mãe.
O papel da mulher na
igreja não deve ser só o de mãe e com um trabalho limitado. Não, tem outra
coisa. O papa Paulo 6° escreveu uma coisa belíssima sobre as mulheres. Creio
que se deva ir adiante esse papel. Não se pode entender uma igreja sem uma
mulher ativa.
Um exemplo histórico: para
mim, as mulheres paraguaias são as mais gloriosas da América Latina. Sobraram,
depois da guerra (1864-1870), oito mulheres para cada homem. E essas mulheres
fizeram uma escolha um pouco difícil. A escolha de ter filhos para salvar a
pátria, a cultura, a fé, a língua.
Na igreja, se deve pensar
nas mulheres sob essa perspectiva. Escolhas de risco, mas como mulher. Acredito
que, até agora, não fizemos uma profunda teologia sobre a mulher. Somente um
pouco aqui, um pouco lá. Tem a que faz a leitura, a presidente da Cáritas, mas
há mais o que fazer. É necessário fazer uma profunda teologia da mulher. Isso é
o que eu penso.
12)
Queremos saber qual a sua relação de trabalho com Bento 16, não a amistosa, a
de colaboração. Não houve antes uma circunstância assim. Os contatos são
frequentes?
A última vez que houve
dois ou três papa, eles não se falavam. Estavam brigando entre si, para ver
quem era o verdadeiro. Eu fiquei muito feliz quando se tornou papa. Também,
quando renunciou, foi, pra mim, um exemplo muito grande. É um homem de Deus, de
reza. Hoje, ele mora no Vaticano.
Alguns me perguntam: como
dois papas podem viver no Vaticano? Eu achei uma frase para explicar isso. É
como ter um avô em casa. Um avô sábio. Na família, um avô é amado, admirado.
Ele é um homem com prudência. Eu o convidei para vir comigo em algumas
ocasiões. Ele prefere ficar reservado. Se eu tenho alguma dificuldade, não
entendo alguma coisa, posso ir até ele.
Sobre o problema grave do
Vatileaks [vazamento de documentos secretos], ele me disse tudo com
simplicidade. Tem uma coisa que não sei se vocês sabem: Em 8 de fevereiro, no
discurso, ele falou: "Entre vocês está o próximo papa. Eu prometo
obediência". Isso é grande.
13)
O sr. falou com os bispos brasileiros sobre a participação das mulheres na
igreja. Gostaria de entender melhor como deve ser essa participação. O que sr. pensa
sobre a ordenação das mulheres?
Sobre a participação das
mulheres na igreja, não se pode limitar a alguns cargos: a catequista, a
presidente da Cáritas. Deve ser mais, muito mais. Sobre a ordenação, a igreja
já falou e disse que não. João Paulo 2° disse com uma formulação definitiva.
Essa porta está fechada. Nossa senhora, Maria, é mais importante que os
apóstolos. A mulher na igreja é mais importante que os bispos e os padres.
Acredito que falte uma especificação teológica.
14)
Nesta viagem, o sr. falou de misericórdia Sobre o acesso aos sacreamentos dos
divorciados, existe a possibilidade de mudar alguma coisa na disciplina da
igreja?
Essa é uma pergunta que
sempre se faz. A misericórdia é maior do que o exemplo que você deu. Essa
mudança de época e també tantos problemas na igreja, como alguns testemunhos de
alguns padres, problemas de corrupção, do clericalismo A igreja é mãe. Ela cura
os feridos. Ela não se cansa de perdoar.
Os divorciados podem fazer
a comunhão. Não podem quando estão na segunda união. Esse problema deve ser
estudado pela pastoral matrimonial. Há 15 dias, esteve comigo o secretário do
sínodo dos bispos, para discutir o tema do próximo sínodo. E posso dizer que
estamos a caminho de uma pastoral matrimonial mais profunda. O cardeal Guarantino
disse ao meu antecessor que a metade dos matrimônios é nula. Porque as pessoas
se casam sem maturidade ou porque socialmente devem se casar. Isso também entra
na Pastoral do Matrimônio.
A questão da anulação do
casamento deve ser revisada. É complexa a questão pastoral do matrimônio.
15)
Em quatro meses de Pontificado, pode nos fazer um pequeno balanço e dizer o que
foi o pior e o melhor de ser Papa? O que mais lhe surpreendeu neste período?
Não sei como responder
isso, de verdade. Coisas ruins, ruins, não aconteceram. Coisas belas, sim. Por
exemplo, o encontro com os bispos italianos, que foi tão bonito. Como bispo da
capital da Itália, me senti em casa com eles. Uma coisa dolorosa foi a visita a
Lampeduse [ilha que recebe imigrantes africanos], me fez chorar. Me fez bem.
Quando chegam estes barcos, que os deixam a algumas milhas de distância da
costa e eles têm de chegar (à costa) sozinhos, isso me dói porque penso que
essas pessoas são vítimas do sistema sócio-econômico mundial.
Mas a coisa pior é o nervo
ciático, é verdade, tive isso no primeiro mês. É verdade! Para uma entrevista,
tive de me acomodar numa poltrona e isso me fez mal, era dolorosíssimo, não
desejo isso a ninguém. O encontro com os seminaristas religiosos foi belíssimo.
Também o encontro com os alunos do colégio jesuíta foi belíssimo. As
pessoasconheci tantas pessoas boas no Vaticano. Isso é verdade, eu faço
justiça. Tantas pessoas boas, mas boas, boas, boas.
Tem a esperança de que
esta viagem ao Brasil contribua para trazer de volta os fiéis? Os argentinos se
perguntam: não sente falta de estar em Buenos Aires, pegar um ônibus?
Uma viagem do papa sempre
faz bem. E creio que a viagem ao Brasil fará bem, não apenas a presença do
Papa. Eles (os brasileiros) se mobilizaram e vão ajudar muito a igreja. Tantos
fiéis que foram se sentem felizes. Acho que será positivo não só pela viagem,
mas pela jornada, um evento maravilhoso. Buenos Aires, sim, sinto falta. Mas é
uma saudade serena.
16)
O que o senhor pretende fazer em relação ao monsenhor Ricca e como pretende
enfrentar toda esta questão do lobby gay?
Sobre monsenhor Ricca, fiz
o que o direito canônico manda fazer, a investigação prévia. E nessa
investigação não tem nada do que o acusam. Não achamos nada. É a minha
resposta.
Quero acrescentar uma
coisa a mais sobre isso. Tenho visto que muitas vezes na igreja se buscam os
pecados da juventude, por exemplo. E se publica.
Abuso de menores é
diferente. Mas, se uma pessoa, seja laica ou padre ou freira, pecou e esconde,
o Senhor perdoa. Quando o Senhor perdoa, o Senhor esquece.
E isso é importante para a
nossa vida. Quando vamos confessar e nós dizemos que pecamos, o senhor esquece
e nós não temos o direito de não esquecer. Isso é um perigo.
O que é importante é uma
teologia do pecado. Tantas vezes penso em São Pedro, que cometeu tantos pecados
e venerava Cristo. E esse pecador foi transformado em Papa.
Vocês vêm muita coisa
escrita sobre o lobby gay. Eu ainda não vi ninguém no Vaticano com um cartão de
identidade dizendo que é gay. Dizem que há alguns. Acho que, quando alguém se
vê com uma pessoa assim, devemos distinguir entre o fato de que uma pessoa é
gay e formar um lobby gay, porque nem todos os lobbys são bons. Isso é o que é
ruim.
Se uma pessoa é gay e procura Deus e tem boa vontade,
quem sou eu, por caridade, para julgá-lo? O catecismo da Igreja Católica
explica isso muito bem. Diz que eles não devem ser discriminados por causa
disso, mas integrados na sociedade. O problema não é ter essa tendência. Não!
Devemos ser como irmãos. O problema é o lobby dessa tendência, da tendência de
pessoas gananciosas: lobby político, de maçons, tantos lobbies
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